quarta-feira, 24 de março de 2021

 

O CIRCO DO PARTIDÃO

(Esta crônica será publicada no livro "Histórias que ningúem vai contar")



Sobrava protagonismo ao PCB de Dourados. Lembro-me de que de certa feita, os trabalhadores rurais anunciaram que iriam acampar na cidade, pela reforma agrária. Quando chegaram à gleba escolhida, que ficava próxima à rodoviária, o local já estava todo demarcado e com os cavaletes de agua instalados. Era a força e a ação do Partidão.

Lá, tudo era no capricho. Certa vez, conceberam um projeto de agitação e propaganda que marcou época. Meticulosamente detalhado pelo arquiteto Luiz Carlos Ribeiro e pelo engenheiro Guilherme Meldau foi criado um circo para conversar com a população nos bairros. Guilherme era orgulhoso do fato de seu avô ter sido companheiro de pensão de Lenin, na Alemanha.

A estrutura da tenda do circo era de tubos metálicos com encaixes, aparafusadas uns aos outros resultando numa forma sextavada, coberta por uma lona plástica nas cores vermelha e amarela com capacidade de abrigar umas 50 pessoas sentadas. A infraestrutura ela completada por bancos e cadeiras de madeira, um cavalete com rolo de papel que funcionava como uma lousa.  Havia também um sistema de som que circulava em uma Kombi para a divulgação da atividade e que era depois montado no interior do circo durante o evento.  Na parte da manhã, o som percorria as ruas do bairro anunciando o evento no circo, ajudado por militantes que reforçavam o convite casa em casa, todos embandeirados e uniformizados com camisetas do Partidão, como forma de dar visibilidade ao Partido O sucesso era garantido. Juntava muita gente.

 

O circo chegou

Vamos todos até lá

Olha que o circo chegou

Não custa nada você ir até lá

 (Jorge Ben Jor)

Algumas horas antes do início do evento, os militantes no dia marcado chegavam ao local do evento e montavam o circo. Alguns dos nossos militantes com dotes artísticos e culturais faziam o papel de palhaços, e desenvolviam outras performances, organizavam brincadeiras com as crianças, horas antes do início do evento, as quais, uma vez atraídas, acabavam nos ajudando na mobilização dos moradores, já que iam contar aos pais o que estava acontecendo no bairro, e os convidava a lá comparecerem. Quando possível eram levadas algumas personalidades destacadas no cenário municipal, estadual ou nacional para estes eventos, que ao final eram encerrados com uma fala sobre o partido e a sua política.

Nas eleições municipais de 1988, quando lançamos Alan Pithan para prefeito em Campo Grande, o circo foi transferido para a capital para ajudar na campanha, ampliando as suas atividades. Eram dadas palestras, e prestados atendimentos sobre saúde; professores e pedagogos ajudavam com a recreação para as crianças. Na sequência falavam os nossos candidatos sobre suas candidatura e militantes, sobre a política do partido.

Outra inovação aqui introduzida foi a venda de comida feita pelos militantes. Não faltava o carreteiro, churrasquinho, mas tinha também comida mais sofisticada. Lembrou-me outro dia a Dedê Cesco, hoje afamada chef, de uma torta que ela fazia, chamada Kulebyaka - da tradicional da cozinha russa - a massa era levedada e os recheios eram múltiplos: linguado, molho bechamel e caviar. O caviar, item caro, era fornecido pela dispensa da sua mãe.

  Também, utilizamos o circo para fazer um acampamento de jovens militantes, na cidade de Rio Verde, para evento de formação política durante o carnaval. Bons tempos. 

  Ao final, depois de enrolarmos por um bom tempo, o circo foi afinal devolvido aos companheiros de Dourados, com dor no coração.

FAUSTO MATTO GROSSO

(Este texto teve como referência, um texto escrito do companheiro Ênio Ribeiro, e ajudas à memória de Luiz Carlos Ribeiro, Edilson Pereira e Dedê Cesco).

2 comentários:

Unknown disse...

Muito bom Fausto, leitura agradável mesmo para quem não viveu aquela época e não era simpatizante da causa. Parabéns

Sergio Leal disse...

Nas eleições de 1988 esteve nas imediações de minha casa. lembro do circo!