domingo, 23 de dezembro de 1990

ESCOLAS PARTICULARES E NEO-LIBERALISMO


(Jornal do Brasil Central – 23/12/90)
(A Crítica – 23/12/90)
Nos velhos tempos da ditadura, dizia um amigo que o problema maior não era o Médice lá em Brasília e sim o delegado de Jaraguari. Certíssimo.
Tirando partido da crise do “socialismo real”, o neo-liberalismo, que de novo não tem nada, bate duro e tenta consolidar uma hegemonia mundial que, passando pelos gabinetes oficiais de Brasília acaba chegando aqui na província. Diretor de escola particular vira filósofo do “laisse faire”, sumo sacerdote da “ sagrada iniciativa privada”, capitão do mato do “quem pode mais chora menos”.
O ensino vira produto de balcão. Aliás de qualidade duvidosa. O aluno prestamista. O professor “proletário” mal pago e alienado. Enquanto isso o ensino público, coitado, filho indesejado do Estado privatista, morre à mingua.
Estava escrito que o Collor ia dar nisso. Neo-liberalismo anunciado. Livra negociação. Entre o pescoço e a guilhotina
Não é livre a negociação entre pai de aluno e o lobby das escolas particulares. As escolas, salvo poucas exceções, exigem contratos leoninos, reajustam mensalidades à revelia da lei, negam informações à justiça, recusam matrículas, dificultam transferências. Tudo isso impunemente.
Os pais, quando resistem, enfrentam transferências compulsórias dos filhos, prazos fatais de matrícula e dificuldades de via judicial (inclusive econômicas). As escolas, enfim, “dão as cartas e jogam de mão”.
Enquanto isso o governo Collor, interesseiramente eqüidistante, assiste no “Coliseu Brasil Novo” a livre negociação entre o leão e o braço desarmado.
De positivo só tem um fato. Encostada na parede pela crise e pela prepotência, a sociedade mostra animadores sinais de resistência. Em Mato Grosso do Sul já tem a sua Associação Estadual de Pais, já entra na justiça , já questiona o que estão fazendo lá em Brasília os seus políticos, já mostra sintomas de indignação cívica. Do jeito que a coisa anda, tem muito eleitor que vai acabar virando cidadão. Daí , quem sabe, acabamos virando uma democracia. Aí sim, neo-liberalismo nunca mais, Collor idem.

FAUSTO MATTO GROSSO,

Engenheiro Civil, Professor da UFMS.