quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Fausto Matto Grosso: "Herança maldita e cleptocracia''

Em 2003, após três tentativas frustradas, Lula assume pela primeira vez a Presidência da República. Enfim, chega ao poder para cuidar do que chamou de “herança maldita”, deixada por FHC, mera retórica da política de polarização e de “construção do inimigo”, já que, inclusive deu continuidade a sua política econômica. Nada mais parecido com Malan do que Pallocci e Meirelles. 
Em 2014, passados 12 anos e três governos do PT, a candidata Dilma continuou brigando com o passado, fazendo política pelo retrovisor.  Disputando a eleição sem programa de futuro, venceu por estreita margem de votos - e se considerarmos os 27,44% abstenção, votos brancos e nulos – recebeu apoio de menos de 40% dos eleitores. 
Presidente legitimamente eleita, mas fraca para assumir, em um país dividido, a sua própria “herança maldita”. Herdou, de si própria, um país em profunda crise econômica, política e moral. Foi a única presidente, depois da redemocratização, que entregou o governo com indicadores da economia, piores do que recebeu.
A economia em crise, ameaça até os avanços sociais conseguidos nos últimos 25 anos, prenunciando dias difíceis para a população, atingida diretamente pela inflação e pela previsível volta do desemprego, resultado natural do crescimento pífio da economia.
As taxas de crescimento e de inflação fogem das metas, mostrando o completo descontrole de gestão, apesar da “contabilidade criativa”. Ingressamos no terreno pantanoso da estagflação. A isso o governo responde com falsificações e manipulações de informações, que humilham órgãos de longos anos de prestígio técnico, levando crise ao interior destes, como aconteceu com o IPEA e com o IBGE.
As contas públicas não fecham. O Brasil entrou no “cheque especial”, ou seja, para o clube de pagadores das dívidas com juros mais altos. Ao não cumprir os limites da Lei de Diretrizes Orçamentárias o governo tenta alterá-la no Congresso. Simples assim – não cumpre a lei, quer muda a lei. 
No aspecto político, a herança de Dilma também é “maldita”. O presidencialismo de coalizão entrou em crise com a rebeldia da base governista, principalmente do PMDB, que reage ao hegemonismo petista. Apesar do tamanho da sua bancada, o aliado teve no governo apenas três ministérios, diante dos 20 controlados pelas diversas tendências do PT. O “custo PMDB” ficará cada vez mais caro quanto mais se acentuar o tamanho da crise de legitimidade da Presidente, sendo que esta, cercado pelos escândalos de corrupção, fica mais impotente para conseguir manter o sistema tradicional de cooptação por amor comprado.
A radicalização da disputa presidencial turvou ainda mais o ambiente político. O país por conta do marketing eleitoral de desconstrução do adversário, primeiro Marina, depois Aécio, encontra-se profundamente dividido. Por sua vez, o PT, em um completo autismo político, cobra da Presidente uma maior radicalização, tentando organizar uma restrita frente de esquerda para a sua sustentação.
No aspecto moral, o governo está no chão. Dilma, logicamente, sabia dos subterrâneos da Petrobras, tanto que afastou diretores indicados por Lula, mas não apurou seus “mal feitos”. Era a criatura protegendo o criador, o presidente “mais probo” que esse país jamais conheceu. Na verdade, o grande líder e grande gênio que transformou o “modo petista de governar” em um novo regime de governo, a cleptocracia.
Após o alucinado desvario durante a campanha, quando qualquer crítica à política do governo era atacada como coisa de direita, agora sim, Dilma e o PT vão saber quem é, de fato, a direita.
Alimentaram a fera, agora ela, raivosa e fortalecida, cheia de razão, está se mostrando nas ruas querendo o diálogo da “degola” da Presidente.


Fausto Matto Grosso. Engenheiro e professor da UFMS