sexta-feira, 18 de novembro de 1994

FORMAS EFETIVAS DE INTEGRAÇÃO DAS ATIVIDADES ACADÊMICAS (A EXPERIÊNCIA DA UFMS)

"Gerar e disseminar conhecimento para a sociedade, obedecendo o princípio da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão". Assim foi definida a missão da UFMS no processo de planejamento estratégico que produziu o nosso Plano Diretor 94/97.
A "Política de Extensão", em apreciação no Conselho de Ensino e Pesquisa e Extensão, caracteriza a extensão universitária como "processo educativo, cultural e científico que articula o ensino e a pesquisa de forma indissociável e viabiliza a relação transformadora entre a Universidade e a Sociedade".
Nessas definições estão contidos os elementos estruturadores da nossa ação acadêmica.
Ressalta-se imediatamente o compromisso com a produção do conhecimento e não apenas de sua reprodução. Ao mesmo tempo assenta-se o compromisso de orienta-lo a uma ação recíproca, transformadora, entre a Universidade e a Sociedade.
Patenteia-se também a compreensão de que a extensão, atividade de ligação da pesquisa e do ensino com a sociedade, não tem autonomia em relação a essas funções básicas e fundamentais. Quando o ensino e a pesquisa ligarem a teoria à pratica social e responderem às demandas concretas da sociedade, perderia sentido a extensão como categoria específica de trabalho acadêmico. Enquanto tal não acontece, importante papel cabe à extensão universitária, no sentido de tensionar o ensino e a pesquisa em direção à sociedade, buscando com ela uma relação dialética, de influência recíproca.
As dificuldades para a implementação dessa visão de extensão são imensas. São exatamente do tamanho do desafio que pesa hoje sobre a Universidade Brasileira. Romper a tradição de isolamento cultural, de cientificismo alienado, de distanciamento político e de alheiamento em relação aos problemas concretos vivenciados pela sociedade constitui desafio capaz de revolucionar a Universidade e faze-la digna do apoio social, político e econômico que reivindica.
Estas questões conceituais não são, entretanto, objeto de nossa análise, constituem apenas o pano de fundo para as questões práticas suscitadas pelo tema proposto.
Estão postas para a extensão na UFMS três desafios fundamentais de trabalho:
I - Tornar a Universidade permeável às demandas e à participação da sociedade. Nesse sentido busca-se privilegiar iniciativas que sejam fruto de demandas concretas das organizações governamentais e não-governamentais, articula-se um amplo leque de convênios de cooperação mútua, e busca-se mecanismos de articulação permanente com a sociedade ( Exemplo: criação da Associação de ex-Alunos, implantação, em 95, do jantar mensal de trabalho que reunirá dirigentes da Universidade com dirigentes e lideranças da Sociedade Política e da Sociedade Civil, etc.).
II - Levar à sociedade, como parte do processo de construção da praxis do conhecimento, a nossa produção científica, técnica e cultural.
III - Buscar a indissociabilidade do ensino, pesquisa e extensão. Este desafio, concatenado com os outros dois, é exatamente aquele que constitui o foco de interesse da presente análise e que procuraremos desenvolver na continuidade.
A administração do sistema de extensão da UFMS nos últimos dois anos levaram-nos a algumas conclusões de como pode se dar, na prática, a integração entre ensino, pesquisa e extensão, de como o ensino e a pesquisa podem se transformar em extensão, e esta, por sua vez, pode possibilitar o desenvolvimento do ensino e da pesquisa. Não que já tenhamos conseguido levar plenamente todas essas idéias à pratica. Muitas delas correspondem apenas a propostas ou a expectativas que precisam ainda ser materializadas.
Nesse sentido apresentamos algumas indicações objetivas, de carater prático:
a - Criação de pólos de extensão. Corresponde à idéia de adotar determinadas regiões como área de concentração de atividades da Universidade, verdadeiros laboratórios para a nossa intervenção interdisciplinar. Concentrar ações em um mesmo objeto, ajuda na integração das ações e potencializam a interlocução do diversos agentes. Seriam levados a essa região os estágios supervisionados dos diversos cursos, atividades de extensão como assessorias às escolas, aos postos de saúde, às empresas, aos pequenos produtores e ao movimento comunitário, pesquisas realizadas por alunos e professores (levantamentos de indicadores econômicos, sociais e ambientais, estudos de uso e ocupação do solo, sobre geração de emprego e renda, etc. A confluência dessas diversas ações multidisciplinares, de ensino, pesquisa e extensão acaba provocando a integração e a ação recíproca entre elas, com ganhos de qualidade para todas elas. A UFMS desenvolve atualmente, dentro dessa perspectiva, o "Programa Bacia do Córrego Bandeira", com o apoio da SESu/MEC.
b - Pesquisa com transferência de tecnologia. Os pesquisadores muitas vezes se contentam em ver publicados seus "papers" nas revistas especializadas. A Universidade não pode se limitar a isso, pelo contrário, deve buscar democratizar e generalizar na sociedade (extensão) as informações sobre os resultados das investigações , levando a ciência à vida cotidiana. Exemplo: a pesquisa sobre reprodução dos peixes regionais, gerou a tecnologia que embasou o desenvolvimento da piscicultura de Mato Grosso do Sul, que por sua vez, passou a exigir novas pesquisas. De forma semelhante aconteceu o trabalho sobre a reprodução de jacarés em cativeiro.
c - Implantação de Programas de Educação Continuada. Este tipo de atividade liga o ensino com a extensão e responde a uma exigência colocada pela rápida superação do conhecimento que tem decorrido da Revolução Tenico-Científica. O exercício dessa prática ajuda a sintonizar e sincronizar o ensino e a pesquisa com a realidade da produção da vida material e espiritual da sociedade e tensiona vigorosamente tais atividades acadêmicas no sentido da sua atualização e qualificação, trazendo implicações para as estruturas curriculares e indicações para os programas de pesquisa. A experiência da UFMS tem sido a de programar tais atividades em parceria com as entidades profissionais (atualmente temos convênios para essa finalidade com cerca de 35 entidades entre Conselhos, Sindicatos, Associações e Sociedades de especialidades)
d- Abertura de disciplinas à matrícula de alunos em regime especial. Essa modalidade era antiga na UFMS, mas muito pouco incentivada, divulgada e utilizada. Havia sido criada, quando entre nós vigia o regime de matrícula por disciplina. Com a mudança para o regime seriado, a legislação a ela relativa caducou. Durante o ano de 1994 os cursos de Economia e Administração, ofereceram como atividade de extensão, em caráter experimental, vagas em 6 disciplinas, com intensa disputa pela oportunidade. Lideranças sindicais e outros membros da comunidade participam dos cursos de Teoria das Crises Econômicas, Economia Brasileira, Introdução à Economia e Economia Política. Técnicos da Sanesul, cursam disciplinas da área de Administração, como parte do programa de desenvolvimento de recursos humanos da empresa. Essa experiência ainda está por ser avaliada, mas nutrimos grandes expectativas pela sua generalização. Os benefícios à comunidade são importantíssimos, ao mesmo tempo, a interação desses alunos especiais, mais maduros, alguns com grande experiência prática, com os alunos regulares e com os professores, tem condições de impactar positivamente as turmas e mesmo o nível de trabalho com as disciplinas.
e - O uso dos estágios supervisionados com o objetivo de estabelecimento de relação transformadora entre universidade e sociedade. Tradicionalmente o momento do estágio tem sido o de reconhecimento de que "a teoria na prática é outra". Esta situação, quando acontece, revela o ensino defasado em relação realidade da sociedade. Um ensino de boa qualidade e atualizado deve ser capaz de colocar o estagiário em uma condição transformadora (não apenas receptor passivo de informações técnicas dos modus operandis consagrados), interagindo com a sociedade (portanto fazendo extensão) e levando a ela o conhecimento técnico e científico qualificado e recolhendo dessa o "feed back" tão necessário para fazer o ensino avançar.
Esperamos que a apresentação dessas experiências, reflexões e idéias possa ajudar na construção coletiva de caminhos para a extensão universitária transformadora.

FRANCISCO FAUSTO MATTO GROSSO PEREIRA

artigo.doc - 18/11/94 Pró-Reitor de Extensão e Assuntos Estudantís da UFMS