sexta-feira, 26 de maio de 2017


UMA NOVA MAIORIA

        Marcado por escândalos de corrupção e por uma herança de irresponsabilidades que marcaram a administração pública nas últimas décadas, o País vive hoje uma grande inquietação.

        As delações da Odebrecht e do grupo JBS, entre outras, atingiram em cheio o sistema político e mostraram o alto grau de contaminação dos poderes da república pela corrupção que molda a relação público-privada no Brasil. Os brasileiros tomaram conhecimento da corrupção, que todos sabiam existir, mas não conseguiam avaliar sua chocante extensão. Praticamente, não sobrou pedra sobre pedra na política brasileira, agravando a apartação do mundo da  política em relação à sociedade. Vivemos um grave déficit de representação.

        Ao mesmo temo vivemos uma profunda divisão no interior da sociedade política e da sociedade civil. A guerra não pode ser a continuação da política, e sim a política a continuação da guerra. As divergências são naturais nas sociedades democrática, mas as disputas sectárias precisam cessar nesse momento de grave crise institucional, onde as vitimas serão os brasileiros, especialmente os mais vulneráveis.

        O Governo de transição, herdeiro de um enorme passivo econômico e social,  mesmo as custas de práticas da velha política fisiológica, estava começando a colher os primeiros frutos do enfrentamento da crise econômica, quando o Presidente foi fulminado, também, por denúncias que lhe tiraram qualquer capacidade de manter a governabilidade e a continuidade das reformas.

        Hoje o presidente Temer está com os dias contados. Apenas não se sabe qual será a forma do seu afastamento. Impõe-se às forças democráticas o desafio de organizar a continuidade da transição até as eleições de 2018, dentro dos ditames da Constituição.

        Muitos esperam o nome do futuro presidente como se houvesse alguém, com predicados especiais, capaz de tirar o país da crise. Não existe esse nome. Só a conformação de uma "nova maioria" construída a partir do reconhecimento da gravidade da crise e por forte pressão da sociedade, pode conformar um novo bloco político comprometido com a continuidade das reformas e com medidas de recuperação da economia.

        Para isso impõe-se o amplo diálogo que deverá envolver setores responsáveis da oposição e da situação. Gostemos ou não, deverão ser construídas pontes entre o PT, o PSDB e o PMDB, as três maiores forças políticas do País. Isso poderá ser a oportunidade de medir o grau de responsabilidade que esses partidos tem com o País, para além de seus projetos de poder. É hora de dar curso à escolha, via Congresso Nacional, do novo presidente para a continuidade da transição. Impõe-se o isolamento dos extremos salvacionistas e oportunistas que têm se igualado na prática da intolerância, às vezes da violência.

        A "maioria" costurada por Temer, com forte componente fisiológica, não servirá mais para esse momento. Não há mais trocas a fazer com essa gente, essa via se esgotou. A construção de uma nova maioria, que possa sustentar a continuidade da transição, exige a troca da pequena política, onde cada deputado é uma entidade, pelo fortalecimento de lideranças comprometidas com a grande política que o momento exige.

        Não tenhamos ilusões, gostemos ou não, a transição terá que ser feita como o mesmo Congresso que se encontra desmoralizado pela velha política fisiológica. Não existe outro. Mas os homens são eles próprios e as suas circunstâncias históricas.  A Lava Jato, pode impor uma nova lógica nas relações políticas, principalmente se isso for combinado com uma forte pressão da sociedade.

        Entre as reformas a serem feitas nesse período, impõe-se a do sistema eleitoral e a da organização partidária, que controle ao descalabro dos partidos de aluguel.  Temos que chegar a 2018, com novas regras que inibam a influência do poder econômico nas eleições, matéria que está na raiz da atual crise de representação, ao mesmo tempo que se reestruture o sistema partidário em torno da representação de ideias e valores, acima dos interesses dos políticos profissionais.

        O Brasil não vai acabar, temos que aproveitar essa crise, para mudar a qualidade da nossa política, afinal, sem ela não há democracia.

Fausto Matto Grosso

Professor da UFMS. Membro do Diretório Nacional do PPS.