terça-feira, 14 de dezembro de 2010

NÃO ME MANDEM CARTÕES

Estamos na época de receber e enviar cartões. Fico emocionado em ver quantos amigos figurões se lembram desse humilde eleitor: vereadores, deputados, senadores, prefeitos, desembargadores, conselheiros do tribunal de contas até meu sindicato e meu conselho profissional.
Envaidecido faço um pedido: não me dêem presentes de mim para mim. Com meu suado dinheirinho, não! Já estou crescidinho, não gosto do jogo do “me engana que eu gosto”.
Esses figurões pensam que estão agradando. De minha parte, levam-me à indignação, perdem pontos. Fazer marketing pessoal, à custa dos meus impostos e taxas, não!
O desvios de conduta pública, mesmo nas pequenas coisas, mostram que esses vícios, de tão antigos, incorporam-se à cultura política. Por incrível que pareça, ainda está por se proclamar a república-de-fato, para separar o público do privado. Como disse o Barão de Itararé “restaure-se a moralidade ou locupletemo-nos todos”
Quando falam contra a privatização do Estado eu fico pensando, com meus botões, sem entender nada. É precisão, na verdade, desprivatizá-lo, retirá-lo dos bancos, das corporações internas, dos lobistas e livrá-lo dos marajás políticos, desculpem-me a palavra de má lembrança.
Já fui vereador. Naquela época devolvia sistematicamente os pacotes de lindos cartões de natal impresso pela Câmara. Devolvia todas as cestas de natal com as quais me agraciavam as empresas de ônibus. Sentia a desaprovação de muitos colegas pelo meu mau exemplo. Já fui Secretário de Estado, sofri a incompreensão de amigos do peito, porque devolvi os bonitos cartões de visitas com que me agraciaram na posse.
Só cito esses casos pessoais porque eles demonstram que é possível, sim, nadar contra a corrente. No mínimo nos dá uma agradável sensação do passarinho que carrega água no bico para apagar o incêndio florestal dos costumes políticos. O que, na época, era simples censura, ou incompreensão, diante da degradação atual, talvez me levasse hoje a uma comissão de ética, por quebra de decoro.
Em tempo: adoro receber cartão dos meus amigos peito. Sinto muito orgulho de ter muitos e grandes amigos, agora, inclusive, meus amigos virtuais que se espalham pelas redes sociais.

Boas festas e feliz 2011 para todos!

FAUSTO MATTO GROSSO
Engenheiro, Professor a UFMS
faustomt@terra.com.b

terça-feira, 12 de outubro de 2010


Na eleição de 1985, Fernando Henrique Cardoso estava virtualmente eleito prefeito de São Paulo quando, na TV recebeu pergunta fatal feita pelo jornalista Bóris Casoy: “Você acredita em Deus?” Ao se declarar ateu, viu o resultado se alterar e, em seu lugar, tomou posse Jânio Quadros.

Já em 1994 FHC foi eleito Presidente da República sempre citando Deus nos seus discursos. Governou inaugurando obras com agradecimentos a Nossa Senhora Aparecida. Essa “conversão” lhe garantiu, também, a reeleição.

Fundamentalismo religioso é uma mistura explosiva entre religião e política. Consiste na interpretação literal de um texto tido como fundamental (tais como o Corão, o Talmud ou a Bíblia) que confere a seus guardiães autoridade máxima, diante da qual nenhuma outra autoridade pode ser invocada. A doutrina deve prevalecer sobre as leis das sociedades democráticas. Fundamentalismos, sejam de natureza religiosa, científica, ideológica, econômica, política ou de qualquer outra adjetivação, são fontes de intolerância e opressão. Não raro, de ditaduras.

A história do fundamentalismo religioso manchou de sangue a humanidade. Sejam as sangrentas Cruzadas contra os muçulmanos até o reverso atentado contra as torres gêmeas em Nova Iorque. As lutas fratricidas no Oriente Médio são provas inequívocas dos males da intolerância religiosa.

Giordano Bruno foi queimado na fogueira pelo crime de heresia na sua concepção astronômica. Também Galileu Galilei, ao defender que a Terra não era o centro do Universo, embora gravemente doente, foi chamado a Roma onde foi julgado pelos tribunais da Inquisição e condenado a renegar publicamente as suas concepções.

A eleição de 2010 se processa nesse nível de intolerância sectária, tendo como tema principal a questão do aborto. Os dois presidenciáveis já no primeiro programa do segundo turno se esmeraram explicitar posicionamentos “a favor da vida”, como se pudesse haver alguém civilizado que pudesse ser a favor da morte.

A principal atingida pelos Torquemadas requentados do século XXI foi Dilma Rousseff, que melhor se colocando quanto ao intrincado tema do aborto, apontando-o como uma questão de saúde pública, teve que recuar para uma posição defensiva e humilhante. Em seu socorro veio a Comissão Brasileira Justiça e Paz, da CNBB, com uma apropriada nota pública para condenar o uso da fé cristã no processo eleitoral. "Muitos grupos, em nome da fé cristã, têm criado dificuldades para o voto livre e consciente", diz a nota.

Quanto a José Serra, de que nada sei sua fé e não tenho o menor interesse em saber, postou-se mais dentro dos cânones da ortodoxia religiosa. Apenas fica a dúvida se foi o aprendizado com a nefasta experiência de FHC ou se tem coerência com a sua militância na esquerda católica nos anos 60. Nesse período Serra militou na Ação Popular, originária da Juventude Universitária Católica e da Juventude Operária Católica em companhia de Betinho e Sérgio Mota e José Travassos, entre os mais conhecidos.

O Brasil, felizmente, não tem entre os seus males a intolerância religiosa. Tomara que continue sempre assim. Já na Constituinte de 1946, Jorge Amado, deputado pelo Partido Comunista, foi o autor do dispositivo constitucional de descriminalizou os cultos africanos do candomblé e da umbanda, até então tratados como caso de polícia. Era um não crente em defesa da liberdade religiosa, dos direitos e da cultura dos negros pobres.


Obscurantismos a parte, precisamos é eleger um Presidente que tenha uma estatura de estadista comporte-se como tal, dê exemplos positivos para a sociedade, que seja o melhor para liderar a nação brasileira no enfrentamento dos seus problemas apontando valores para a construção do um mundo melhor. Com todo o respeito, não acho que devamos escolher alguém para ajudar na sacristia ou nos púlpitos das pregações.

Fausto Matto Grosso
Engenheiro, professor da UFMS
faustomt@terra.com.br
Jornal da Cidade - 11/10/2010

domingo, 10 de outubro de 2010

FUNDAMENTALISMO RELIGIOSO E HIPOCRISIA

Na eleição de 1985, Fernando Henrique Cardoso estava virtualmente eleito prefeito de São Paulo quando, na TV recebeu pergunta fatal feita pelo jornalista Bóris Casoy: “Você acredita em Deus?” Ao se declarar ateu, viu o resultado se alterar e, em seu lugar, tomou posse Jânio Quadros.
Já em 2004 FHC foi eleito Presidente da República sempre citando Deus nos seus discursos. Governou inaugurando obras com agradecimentos a Nossa Senhora Aparecida. Essa “conversão” lhe garantiu, também, a reeleição.
Fundamentalismo religioso é uma mistura explosiva entre religião e política. Consiste na interpretação literal de um texto tido como fundamental (tais como o Corão, o Talmud ou a Bíblia) que confere a seus guardiães autoridade máxima, diante da qual nenhuma outra autoridade pode ser invocada. A doutrina deve prevalecer sobre as leis das sociedades democráticas. Fundamentalismos, sejam de natureza religiosa, científica, ideológica, econômica, política ou de qualquer outra adjetivação, são fontes de intolerância e opressão. Não raro, de ditaduras.
A história do fundamentalismo religioso manchou de sangue a humanidade. Sejam as sangrentas Cruzadas contra os muçulmanos até o reverso atentado contra as torres gêmeas em Nova Iorque. As lutas fratricidas no Oriente Médio são provas inequívocas dos males da intolerância religiosa.
Giordano Bruno foi queimado na fogueira pelo crime de heresia na sua concepção astronômica. Também Galileu Galilei, ao defender que a Terra não era o centro do Universo, embora gravemente doente, foi chamado a Roma onde foi julgado pelos tribunais da Inquisição e condenado a renegar publicamente as suas concepções.
A eleição de 2010 se processa nesse nível de intolerância sectária, tendo como tema principal a questão do aborto. Os dois presidenciáveis já no primeiro programa do segundo turno se esmeraram explicitar posicionamentos “a favor da vida”, como se pudesse haver alguém civilizado que pudesse ser a favor da morte.
A principal atingida pelos Torquemadas requentados do século XXI foi Dilma Russeff, que melhor se colocando quanto ao intrincado tema do aborto, apontando-o como uma questão de saúde pública, teve que recuar para uma posição defensiva e humilhante. Em seu socorro veio a Comissão Brasileira Justiça e Paz, da CNBB, com uma apropriada nota pública para condenar o uso da fé cristã no processo eleitoral. "Muitos grupos, em nome da fé cristã, têm criado dificuldades para o voto livre e consciente", diz a nota.
Quanto a José Serra, de que nada sei sua fé e não tenho o menor interesse em saber, postou-se mais dentro dos cânones da ortodoxia religiosa. Apenas fica a dúvida se foi o aprendizado com a nefasta experiência de FHC ou se tem coerência com a sua militância na esquerda católica nos anos 60. Nesse período Serra militou na Ação Popular, originária da Juventude Universitária Católica e da Juventude Operária Católica em companhia de Betinho e Sérgio Mota e José Travassos, entre os mais conhecidos.
O Brasil, felizmente, não tem entre os seus males a intolerância religiosa. Tomara que continue sempre assim. Já na Constituinte de 1946, Jorge Amado, deputado pelo Partido Comunista, foi o autor do dispositivo constitucional de descriminalizou os cultos africanos do candomblé e da umbanda, até então tratados como caso de polícia. Era um não crente em defesa da liberdade religiosa, dos direitos e da cultura dos negros pobres.
Obscurantismos a parte, precisamos é eleger um Presidente que tenha uma estatura de estadista comporte-se como tal, dê exemplos positivos para a sociedade, que seja o melhor para liderar a nação brasileira no enfrentamento dos seus problemas apontando valores para a construção do um mundo melhor. Com todo o respeito, não acho que devamos escolher alguém para ajudar na sacristia ou nos púlpitos das pregações.

Fausto Matto Grosso
Engenheiro, professor da UFMS

faustomt@terra.com.br

sábado, 11 de setembro de 2010

O MISTERIOSO DINHEIRO DE BRASILIA

O PÇSC (Partido Çossiáu do Seu Creysson) está com tudo nestas eleições. O Tiririca, também, está quase eleito deputado em São Paulo. Assistir ao programa eleitoral de deputados federais e senadores, chega a ser divertido, com todo o respeito, pelo besteirol apresentado pelos candidatos. As exceções são poucas, talvez se contem nos dedos de uma mão, se tanto.
O discurso central desses “nossos representantes”, geralmente, é de que vão trazer dinheiro para o Estado. Não sei se o motivo dessas promessas é a ignorância política pura e simples, não sabem para que serve um deputado, ou é, descaradamente, uma confissão antecipada da velhacaria da política.
Aliás, essa coisa de trazer dinheiro de Brasília, através de emendas parlamentares ou tráfico de influência, é um assunto que não deveria ser comentado na sala, em frente das crianças, muito menos nos horários eleitorais onde os inocentes, mesmos aqueles de maior idade, ainda estão acordados. Entretanto, esse tem sido o tema mais recorrente na propaganda eleitoral. A prática da emenda parlamentar tem sido um dos recantos mais escuros e mal-cheirosos da política.
É necessário jogar luz nesse assunto. Falar o que muitos sabem, mas se calam por conveniência ou leniência. Isso é importante até para que políticos íntegros e bem intencionados, imagino que eles existam, possam escapar desse lodaçal.
Os parlamentares, na sua tarefa de fazer leis, deveriam interagir fortemente com a Sociedade e cumprir o seu papel constitucional. Entretanto, nos tempos atuais, a imensa maioria das leis é formulada pelo Governo e o Congresso Nacional se transformou em mero cartório para homologar a ditadura do Executivo.
Na sua tarefa de acompanhar e fiscalizar o Executivo, deveria se dedicar a avaliar o alcance finalístico dos programas e ações realizadas, avaliar se os recursos foram distribuídos pelos critérios técnicos previstos nos programas, de maneira transparente e republicana, ou ao contrário, se serviu para politicagem barata, tão cara para o bolso do contribuinte.
No momento da análise da Lei Orçamentária, deveria cortar programas de baixa efetividade, fortalecer aqueles que melhor atendem as necessidades dos brasileiros, equilibrando, com a responsabilidade do mandato popular, a distribuição dos recursos entre os diferentes programas, funções, ministérios, Estados e Municípios. Ou seja, tratando do projeto de orçamento nos seus delineamentos maiores, a partir de uma visão de desenvolvimento nacional e de combate aos desequilíbrios regionais. Não cabe nessa hora infiltrar a “emendinha” clientelista e paroquial.
Infelizmente não tem sido esse o caminho. A máxima da atividade parlamentar tem sido a batalha pelas emendas parlamentares mediante as quais se estabelece um jogo espúrio e imoral entre o Executivo e o Legislativo. O início dessa pecaminosa relação é o momento da elaboração do Orçamento. A emenda é, ao mesmo tempo, o instrumento do parlamentar fazer política clientelista e o instrumento de controle político exercido pelo Executivo sobre o Legislativo
O orçamento é apenas uma lei que autoriza o governo a gastar em determinado programa ou ação, mas não lhe impõe a decisão de implementá-lo. A proposição das emendas não tem caráter imperativo, mas os parlamentares vão para os estados e municípios para montar o jogo, com governadores, prefeitos e entidades. É o famoso “me engana que eu gosto”. Anunciam aos quatro ventos que estão trazendo dinheiro para o estado.
Depois vem a realidade. Somente uma parcela ínfima das emendas parlamentares é liberada, assim mesmo mediante chantagem mútua nos momentos das votações decisivas para o Governo. É quando o computador do Planalto pega fogo, selecionando quem pediu o quê, e colocando para funcionar o famoso tabuleiro do franciscanismo do “é dando que se recebe”, do “toma-lá dá-cá”, do “amor remunerado”, seja lá o nome que se queira dar.
Assim a ponte para Cabrobó, ou a ambulância para Nossa Senhora da Mata a Dentro, são trocadas por votos sobre as questões de grande interesse do Executivo. Pior, isso acaba valendo tanto para os parlamentares da situação como para os da oposição de conveniência. É o que nós sempre vemos, mas nem sempre entendemos.
Durante a execução dessas emendas o escândalo é ainda maior. Elas têm “donos” e, segundo a praxe, estes ficam com o direito de cobrar “pedágio” para que esse dinheiro chegue até a obra aprovada. Esse é o reino do baixo clero, a Sapucaí da política brasileira, já exposta nos inúmeros escândalos do Congresso.
Por isso tudo, deveria haver uma lição a ser ensinada desde a escola primária até ao horário político, antecipando-se ao discurso enganoso: não vote em parlamentar que diz que vai trazer dinheiro para o estado. Isso faz mal para a saúde, para a educação, para a agricultura, para a pecuária, para o desenvolvimento, para a cidadania e para a crença na democracia.

FAUSTO MATTO GROSSO
Engenheiro, professor da UFMS
faustomt@terra.com.br
 Publicado no Correio do Estado em 11.09.2010

quinta-feira, 6 de maio de 2010

A LUTA ARMADA E A FRENTE DEMOCRÁTICA

Jamais imaginei que a luta armada da década de 70 pudesse vir a ser, 40 anos depois, matéria de interesse eleitoral. Pois é isso que está acontecendo. A candidatura da ex-ministra Dilma Rousseff despertou uma sanha tão reacionária, quanto interesseira, sobre o tema, em tudo semelhante ao terrorismo eleitoral que fizeram, no passado, quanto ao “perigo Lula”.
Recentes entrevistas de antigos comandantes militares, como o General Leônidas Pires, ex-comandante do temido DOI-CODI de São Paulo, concedidas à TV, puseram mais lenha na fogueira.
Disse o general que toda guerra gera vítimas, o que é verdadeiro, disse, também, que as ações armadas do Exército começaram somente após o frustrado atentado da antiga Ação Popular contra a vida do Presidente Costa e Silva no aeroporto de Recife. Aí ele falta com a verdade histórica. Quem foi enfrentado inicialmente pelas armas foi o Governo Constitucional de João Goulart e a partir daí se implantou uma Ditadura que, por mais de 20 anos, se impôs pela força das armas e pela repressão aos democratas de todos os matizes.
A resistência à ditadura, que se impunha por uma questão ética e política, provocou uma grande divisão entre as forças de esquerda. A principal matriz de onde brotou a esquerda no Brasil, o Partido Comunista Brasileiro - PCB, de imediato apontou o caminho da frente democrática, indicando que a luta não seria fácil e curta e, portanto, deveria envolver uma ampla articulação da sociedade brasileira. Já no início de 1966 reconhecia o recém criado MDB como um espaço válido de luta, indicando aos seus militantes a filiação no Partido. Nessa época, vários militantes e dirigentes do PCB, contrários à política de resistência democrática excluíram-se ou foram expulsos do partido
Com a violenta repressão que se abateu depois do AI-5, a luta armada surgiu como ato desesperado, de resistência ao regime militar. É dessa época o surgimento do MR8 – Movimento Revolucionário Oito de Outubro e da ALN - Aliança Libertadora Nacional, onde pontificavam lideranças como Marighela, José Dirceu, Franklin Martins, Vladimir Palmeira, e Fernando Gabeira, entre os mais conhecidos atualmente, todos originários do PCB. Lá na sua militância estudantil, e depois na frente armada, estava a ex-ministra Dilma Rousseff em uma das diversas organizações que se formaram à época.
Foram pessoas corajosas, idealistas, muitas das quais entregaram as suas vidas por essa causa, mas foram derrotados, principalmente, pelos seus erros históricos e políticos, e não apenas pelas balas e pela tortura da repressão. A luta armada não era o meio mais eficaz, era burra, foi uma tática suicida, ajudou ao endurecimento do regime e à ampliação da repressão contra todos os democratas, das diferentes vertentes.
Ao mesmo tempo em que isso acontecia, militares brasileiros eram treinados em técnicas de combate e em tortura na escola da CIA no Panamá, para onde, alguns tempos depois, muitos voltaram como experientes professores que superaram os mestres.
Mesmo atuando na frente legal, o PCB foi vítima da estratégia de auto-reforma do regime. Havia o receio de que o “Partidão”, com a sua capacidade de articulação política ampla, pudesse transformar o MDB em um partido de massas e de esquerda. Foi nessa época que se abateu a maior repressão sobre os pecebistas. Neste ano, o pacato jornalista Vladimir Herzog e operário Manoel Filho, foram assassinados nas câmaras de tortura. Neste mesmo ano, sete membros do seu Comitê Central, foram assassinados pela ditadura o que, pela primeira vez na sua longa história, obrigou o Partido a retirar sua direção para o exterior.
Ao final, a história fez homenagem à tática vitoriosa da ampla frente democrática na qual militavam os comunistas do PCB, que foram os primeiros a lançar as palavras de ordem pela Anistia, pelos Direitos Humanos, pela Constituinte, pelas liberdades públicas e pelo Estado de Direito Democrático, inclusive se postando contra a extinção do MDB no momento em que o desânimo se abateu sobre os democratas liberais.
Comparando as táticas de luta contra a ditadura, em uma tentativa de síntese histórica pessoal, tenho convicção de que o Presidente Jimmy Carter com a sua denuncia de violação dos direitos humanos no Brasil, fez mais pela nossa democracia do que o Comandante Fidel Castro, também, que Ulisses Guimarães e Tancredo Neves foram mais úteis à causa da democracia do que o bravo Carlos Marighela e o ainda todo poderoso José Dirceu, hoje plenamente anistiado no seu partido, porque, afinal de contas, alguém tinha que fazer “o que precisava ser feito pela causa”.
Voltando ao terrorismo eleitoral, vale dizer que a sociedade democrática que ajudamos a conquistar funciona assim mesmo. Tem alternância, tem direito de diferenças, e outras coisas incômodas. Quem quiser, derrote esses personagens pelas idéias e pelas propostas, pela democracia, jamais fazendo correntes reacionárias como todos nós recebemos diariamente pela internet, tentando atingi-los pelo seu passado guerrilheiro ou pela sua vida pessoal. Devemos julgá-los pelas suas posições no presente e não pelos seus erros do passado. Os militares brasileiros, também, devem ser julgados pela sua postura atual claramente constitucional e profissional.
Pessoalmente, preocupa-me mais a falta de uma auto-critica verdadeira desses lideres com relação a tal passado. Não encontro, na maior parte deles, nenhuma afirmação clara do compromisso com a democracia. Afinal para quem assaltava bancos para arrecadar fundos para uma “boa causa”, que diferença faz comprar “300 deputados picaretas” para um projeto “superior” de poder. Para quem desacreditava na possibilidade de atuar dentro dos sindicatos, todos chamados de “pelegos”, que diferença faz cooptar e anular os movimentos sociais mais importantes do País. Ao que parece continuam prisioneiros da idéia de que “os fins justificam os meios”.
Chorar lágrimas eleitorais de crocodilo no túmulo de Tancredo não vale. Têm que assumir que erraram em não votar nele no colégio eleitoral, quando do outro lado da disputa se encontrava Paulo Maluf, inclusive expulsando seus deputados que assim o fizeram. Precisam explicar onde estavam eles na delicada transição com Sarney e o que fazem junto com Sarney, Collor e Maluf atualmente.

Fausto Matto Grosso
Militante do antigo PCB
faustomt@terra.com.br 02.05.2010

Publicado no Correio do Estado em 06.05.2010

quarta-feira, 21 de abril de 2010

A QUESTÃO ENERGÉTICA

A questão da matriz energético brasileira tem sido alvo de acalorados debates. As opinião são as mais divergentes possíveis. Todos discutem "certezas" absolutas, o que foge ao conceito de matriz, como combinação dos vários modos diferenciados de produzir . Tenho interagido com alguns amigos ligados a esse tema e cada vez mais eles tem apontados a questão do Brasil rediscutir a questão da energia nuclear, citando, inclusive, países como a França e a Alemanha, onde a política verde é bastante forte.
Não tenho nenhuma certeza a respeito desta questao. Apenas preocupação com escolhas erradas e suas possíveis conseqüências.
Pondero, entretato, que a matriz energética reflete a política de desenvolvimento que se quer implementar. Queremos um modelo industrial  sujo (que o centro do mundo exporta para a periferia) ou uma moderna economia pós industrial?
Chamo a atenção para alguns bons consensos já existentes quanto a questão do "desenvolvimento sustentável". É preciso articular a igualdade social com a conservação ambiental e com a eficência econômica...isso todos conhecemos. O X da questão é como fazer isso.
As ultimas conferencias mundiais sobre meio ambiente, desde Estocolmo (1980?), até a de Copenhagen (2010) tem boas dicas nas entrelinhas, normalmente desapercebidas.
Existe um "trade off" entre desenvolvimento e conservação ambiental. Produzir mais significa conservar menos. Entretanto essa equação não é insolúvel. Mudanças no padrão tecnológico permitem produzir mais com conservação ou até com recuperação do meio ambiente. Esse é um dos desafios da questão energética. Desta maneira é posssível aproximar a esfera da conservação da esfera da eficiência econômica. Uma questão correlata a essa é a interligação geral do sistema energético, que acabou com as soluções locais, ou incentiva que a pequena produção local seja colocada no sistema interligado nacional, que atende básicamente às necessidades das grandes metrópoles. Acho que vale rediscutir isso.
Mais não basta apenas isso. A humanidade tem bilhões de párias que precisam comer, comer melhor, habitar decentemente, ter acesso ao conhecimento, etc. Incorporar esses seres humanos aos benefícios da civilização é uma exigência ética. Não podemos condená-los a pagar sozinhos a conta da conservação, como acabam fazendo, embora cheios de boas intenções,  os preservacionistas. Mais gente para consumir só é possivel, se não quisermos implodir o planeta, mudando os padrões de consumo. Não é possível democratizar o acesso aos bens se pensamos em generazar os atuais padrôes de consumo. Não é possível juntar a esfera da igualdade social à esfera da conservação ambiental, sem baixar o padrão perdulário e predatorio da nossa "sociedade de consumo". É impossível, mesmo para uma potencia emergente como a China, resolver deslocamento humano com transporte com veículo individual. Transporte coletivo de qualidade, alongamento da vida útil de máquinas e equipamentos, miniaturização, reciclagem etc
Por último, não querendo ser enfadonho para os que já conhecem bem esses conceitos, tem o desafio de juntar a esfera a esfera da igualdade social com a esfera da eficiência econômica. A geração de mais-riqueza tem que implicar na redistribuição dos ativos sociais (renda, propriedade, acesso a saúde, ao conhecimento, etc.
Mudanças no padrão tecnológico, mudança nos padrões de consumo e mudanças no padrão distributivo, talvez possam ser a marca do PPS na construção de um novo projeto para o Brasil. Isso tudo atende pelo nome simplório de "desenvolvimento sustentável".


Fausto Matto Grosso

sexta-feira, 16 de abril de 2010

FIM DA INOCÊNCIA NA INTERNET

Incontrolável, a internet será um dos palcos mais sangrentos da próxima guerra eleitoral. Se, de um lado a televisão atinge o grande eleitorado com um maior controle da origem da mensagem, por outro lado, a internet é o emaranhado espaço da conspiração subterrânea, onde se enfrentam os formadores de opinião com seus respectivos campos de influência.
Barak Obama articulou uma rede de 30 milhões de endereços eletrônicos. Gabeira quase ganhou a eleição no Rio de Janeiro, usando muito bem essa poderosa arma. Especialistas nessa guerra terão seus preços cobrados em ouro e serão disputados tanto quantos os marqueteiros eleitorais.

Essa guerra já começou e muita gente inocente já se encontra, nela envolvida, fazendo circular falsas ou meias verdades sobre os candidatos.

sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

O QUE PRECISA MUDAR EM MATO GROSSO DO SUL?

A humanidade conviveu muito tempo com o mito de que a simples criação de riquezas, propiciada pelo crescimento econômico, seria uma condição necessária e suficiente para que as pessoas vivessem melhor.
Com o tempo, essa visão foi derrotada e foi se afirmando a idéia de que era necessário colocar as pessoas no centro do desenvolvimento e não a economia. Era a afirmação da idéia do “desenvolvimento humano”.
O IDH – Índice de Desenvolvimento Humano, calculado pela ONU a partir do início dos anos 90, passou a ser usado para avaliar a condição humana, acrescentando à dimensão renda as dimensões longevidade e educação.
Para atualizar os quesitos a serem levantados para cálculo do IDH em 2010, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento realizou, recentemente, uma ampla pesquisa qualitativa que envolveu mais de quinhentos mil brasileiros, convidados a responder a instigante pergunta: “O que precisa ser mudado no Brasil para sua vida melhorar de verdade?”
Os resultados foram contundentes, especialmente para aquele que imaginam que tudo anda bem e que as pessoas estão satisfeitas com a realidade do seu país e com a sua vida. Há uma imensa aspiração por mudanças, que deve ser considerada pelas lideranças políticas no processo eleitoral que se aproxima.
Os resultados, consolidados para Mato Grosso do Sul, revelaram que os temas específicos considerados mais importantes foram: educação (19%), políticas públicas (12,5%), violência (13%), emprego (10,8%), meio ambiente (8,9%), saúde (6,7%), infraestrutura (3,4%), judiciário (2,9%), impostos (2,8%) e pobreza (0,6%).
A pesquisa ainda revelou dois temas transversais prioritários que repassam todos os temas específicos: valores e corrupção.
Esses resultados questionam as tradicionais prioridades das lideranças políticas e dos governantes. A tradicional disputa entre quem fará mais “obra” de infraestrutura, segundo essa pesquisa, é irrelevante para a população.
O importante não é o prédio escolar, mas a qualidade da educação que se pratica no seu interior, sua capacidade de construir cidadania, competência, autonomia, consciência, civismo, responsabilidade pessoal e social. Qual governante trocaria hoje alguns metros cúbicos de concreto ou alguns quilômetros de asfalto, pela internet pública e gratuita para todos os cidadãos ou por um grande salto no patamar de remuneração e qualificação dos professores? O mundo atual baseado na informação, no conhecimento e na aprendizagem exige o repensar revolucionário do papel da informática e da educação na viabilização do país. No campo da educação, por que não assumir o grande desafio de, processualmente, igualar a carreira dos professores da educação básica à carreira dos professores universitários? Porque não?
Na referida pesquisa, o segundo tema mais valorizado é o de políticas públicas. Esse quesito engloba a questão da oferta de bens e serviços públicos competentes e efetivos, que funcionem em benefício e respeitando a população. Trata-se da saúde sem fila nas madrugadas, próxima e com resolutividade, o respeito humano no atendimento. O transporte público sem aperto, confiável, limpo e valorizado como prioritário. A segurança pública que dê tranqüilidade à vida das pessoas, sem deixá-las a mercê do poder real do crime organizado, da bandidagem, do trafico de drogas e da barbárie da violência sempre presente.
O cidadão não percebe, no seu cotidiano, a presença e a competência do serviço público. É preciso que as políticas públicas saiam das estatísticas duvidosas, dos outdoors, dos meios de comunicação, das inaugurações pomposas e dos palanques e percorram as ruas e bairros das cidades.
Atravessando essas e outras prioridades temáticas está a demanda pela afirmação de valores e pelo fim da corrupção no Estado e na sociedade.
Assim, está apontado o inconformismo com a subversão de valores, representada pela desonestidade, pelos escândalos políticos, pelos “não sei e não vi” pelos choros falsos de “lágrimas de crocodilo”, pelo individualismo, pela “lei de Gerson”, pela falta de respeito ao próximo, ao contribuinte e ao consumidor, pela falta de solidariedade pessoal e social, pela mentira, pela alienação e pela hipocrisia.
O descontentamento com a corrupção abrange desde aquela praticada nos governos, nos parlamentos e na justiça, até aquela que é cometida na sociedade, como o suborno, a sonegação de impostos, o contorcionismo cínico do “jeitinho brasileiro” e outras tantas impropriedades do comportamento cotidiano.
A afirmação de valores e o clamor pelo fim da corrupção, como temas transversais, exigem novos comportamentos em todos os âmbitos da vida da sociedade: na educação, nas políticas públicas, na saúde, na construção das obras públicas, na cobrança dos impostos e na relação como o meio ambiente e com a juventude.
Há, portanto, no ambiente, um clamor silencioso por mudanças, que não aparece quando a disputa política e eleitoral se dá entre “quem fará mais do mesmo”. É lógico que a população se decida por alternativas simplórias e medíocres, pela falta de alternativas e de mensagens transformadoras.
Imagino que, se surgirem lideranças, com credibilidade, que subvertam essa lógica tradicional, é bem possível que se repitam casos como o de Barak Obama nos Estados Unidos ou Fernando Gabeira na sua quase vitória no Rio de Janeiro. A grande questão é saber se existe, ou quando existirá, entre nós, algum estadista, sintonizado com o clamor dos tempos atuais e disposto a liderar um processo de mudanças verdadeiras.

Fausto Matto Grosso
Engenheiro e professor da UFMS

faustomt@terra.com.br