sexta-feira, 22 de maio de 2020


A FALTA DE CONFIANÇA NO PRESIDENTE


  O brasileiro não gosta de política e não confia em suas instituições. Isso é muito ruim para a democracia.
  Existe hoje um mal-estar institucional. A elite política não goza da confiança dos cidadãos o que incentiva os cidadãos a buscarem lideranças messiânicas como uma válvula de escape. Nosso sistema não tem sido capaz de gerar uma adesão cívica, como chama a atenção o Professor Marco Aurélio Nogueira. Assim nasceu o mandato de Bolsonaro.
  Confiança é uma palavra chave. É o sentimento de segurança, convicção ou expectativa que se tem de que um indivíduo, grupo ou instituição atue da maneira esperada, em uma dada situação. A confiança é uma espera baseada em probabilidade positiva de que a outra parte cumpra o que prometeu, ou o que é a sua finalidade.
  Na vida econômica a existência de confiança é decisiva. Não houvesse confiança não haveria moeda, cujo valor depende somente da confiança nela depositada. A decisão entre reinvestir ou distribuir lucros depende também da confiança que se tenha no retorno ampliado dos investimentos. No caso de investimentos estrangeiros diretos (IDE), estes dependem da confiança que se tenha nos fatores políticos econômicos, geográficos e culturais de um país, especialmente na estabilidade das regras do jogo.
  Mas é no campo da política onde é mais crítica a questão da confiança, já que é ela que cria e destroem os líderes. Nesse âmbito a situação do Brasil é crítica.
  Recente pesquisa (XP investimentos, jan.2020), no início deste ano, apontou os níveis de confiança nas instituições. Entre as melhores classificadas ficaram Forças Armadas 63%; Igreja Católica 55%; Igrejas Evangélicas 40%. A confiança na Presidência da República foi de 37%, mas está caindo aceleradamente; Senado 15%; Câmara dos Deputados 11% e Partidos Políticos 6%. Percebe-se o desprestígio indiscutível das instituições políticas.
  Nosso presidente não tem gozado da confiança necessária para governar. Pesquisa recente do mesma fonte, mostrou a queda na avaliação do Governo. São apenas 28% os que o consideram bom e ótimo, contra 42% que o consideram ruim ou péssimo – os piores números da série história. Ao mesmo tempo tem melhorado a imagem do Congresso e dos governadores. Estivéssemos em regime parlamentarista, um voto de desconfiança já teria derrubado o gabinete, sem crise, na maior normalidade.
  Falta ao Governo, base congressual, resultado da sua desastrada tentativa de montar sustentação com as bancadas temáticas e não com os partidos políticos. Hoje, diante da possibilidade de impeachement, o Presidente tenta reverter a situação com a fidelização do Centrão, em troca de cargos, prática que esconjurava durante as eleições. Isso tem diminuído ainda mais a confiança da opinião pública.
  Outro segmento com o qual esperava governar era o militar. Embora haja uma militarização do governo, existem indícios de que, institucionalmente, as Forças Armadas começam a temer que o desgaste do governo possa contaminar a sua liderança moral e o seu prestígio. Bolsonaro parece tê-las no varejo, mas não no atacado. 
  Sem confiança e sem adesão cívica não se consegue governar. Bolsonaro já se encontra em modo de impeachement. A espera de Color foi a chegada a 7% de popularidade; Dilma 8%. Com relação ao nosso atual presidente, deixado à sua própria sorte, com o roteiro diário de malfeitos, insensibilidades e imprudências, seu tempo logo se esgotará.
  Como Yuval Harari explicitou em recente artigo na revista Times, hoje a humanidade enfrenta uma crise aguda, não apenas devido ao coronavírus, mas também devido à falta de confiança entre os seres humanos. Para derrotar uma epidemia, as pessoas precisam confiar em especialistas científicos, os cidadãos precisam confiar nas autoridades públicas e os países precisam confiar uns nos outros. No caso brasileiro, essa realidade global combinada com o estilo Bolsonaro de governar, cria uma situação insustentável.
  Nessa situação, sem dúvida alguma, o Brasil não conseguirá sair de suas crises com a baixa confiança na liderança do atual presidente.
FAUSTO MATTO GROSSO
Engenheiro civil, professor aposentado da


sexta-feira, 8 de maio de 2020


INCÊNDIOS FLORESTAIS, PANDEMIA E CRISE POLÍTICA


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  A Amazônia, o Cerrado e o Pantanal já começam novamente a arder em chamas. Os incêndios de 2019, além das perdas econômicas e ambientais, queimaram irremediavelmente a imagem internacional do País.   O que foi feito de lá para cá para diminuir nossa vulnerabilidade? Uma das últimas notícias a respeito foi a intervenção do Presidente querendo punir os servidores que queimaram as máquinas e equipamento dos garimpeiros e desmatadores ilegais.
  Corremos o sério risco de assistirmos, daqui para frente, a superposição da crise política com o coronavirus e os incêndios florestais.
  Os temas sociais, ambientais e sanitários parecem mesmo estar ligados. A pandemia do coronavirus, pela diminuição da atividade humana, gerou uma série de efeitos colaterais positivos no meio ambiente. Ao diminuir o tráfego de automóveis e as atividades industriais, diminuiu a poluição ao redor do mundo, como mostram imagens de satélites.
  Em Veneza, os canais voltaram a ter águas cristalinas e peixes. Na Índia, um dos países mais poluídos do mundo, o Himalaia passou a ser visto de cidades a mais de 200 km de distância, recuperando situação de três décadas atrás. Na China, segundo a NASA, imagens de satélites, mostraram um declínio expressivo nos níveis de poluição, principalmente na região de Wuhan, onde se impôs o mais drástico isolamento social.
  Essas realidades, em pequena escala, mostram cabalmente que, controlando a ação do homem, pode-se conseguir fazer uma gestão de risco mais adequada das emissões de gases das mudanças climáticas.  O futuro do planeta, em grande medida, depende das opções que fizermos em termos de combate a desigualdades, de concepção de desenvolvimento e de estilo de vida. Não se trata de voltarmos às cavernas, mas de aproveitar a crise para preparar um “novo normal” mais virtuoso em termos civilizatórios.
  Há muito que se sabe que os momentos de crise são oportunidades de mudanças.          Discute-se agora se a profundidade das nossas crises atuais será capaz de gerar grandes mudanças de paradigmas. Há os que crêem que após a atual pandemia passar, e tudo voltar ao “normal”, o normal já será outro. Outros acreditam que as mudanças serão apenas temporárias e cosméticas, insuficientes para romper esse paradigma baseado em desigualdades sociais, consumo desenfreado e individualismo exacerbado, que são as causas principais de degradação da sociedade e da natureza. Tudo depende do que fizermos ou deixarmos de fazer.
  Em um mundo globalizado tais questões já se tornaram universais. A pandemia do coronavirus veio na direção do aprofundamento da compreensão de que o enfrentamento de problemas sanitários também exige articulação mundial, inclusive com o fortalecimento de instituições multilaterais como a OMS.
  Os diversos países do mundo, em diferentes graus de desenvolvimento, deverão sair da atual crise com mudanças sociais, ambientais e econômicas.  O direito a uma Renda Mínima Universal, para o cidadão, saiu reforçado.  A experiência da quarentena ajudou a recolocar na ordem do dia a questão da redução da jornada e a incorporação de novas modalidades de trabalho como o home office. A segurança alimentar e de insumos para a saúde foram reforçados com questões estratégicas.
  O mundo está intimado a se repensar. Mas em tudo, se impõe uma visão global. Não existe salvação fora do mundo, seja na questão ambiental, social ou sanitária.
  O Brasil está em um mau momento. Nossa crise política nos desmoraliza mundialmente. Na pandemia temos sido expostos a vexames internacionais, da mesma forma como sucedeu no ano passado com a questão das queimadas.  O país não suporta três crises ao mesmo tempo.

Fausto Matto Grosso

Engenheiro e professor aposentado da UFMS