quinta-feira, 30 de maio de 2019



PACTO E CONSTITUIÇÃO
      
Não existem soluções fáceis para problemas difíceis. Vivemos um impasse nas relações entre o executivo, o legislativo, o STR e a sociedade.
Recentemente surgiu, pelas mãos do presidente do Supremo, a idéia de um pacto entre as partes em conflito.  Sempre que há uma ruptura institucional, o que não aconteceu, há necessidade de um novo entendimento nacional para estabelecer uma nova ordem. O Brasil já fez isso com o grande pacto constitucional em 1988, construído com a participação ampla da sociedade.
  Na sociedade, vivemos hoje um sentimento de indignação e de insegurança. Na política, predomina o clima de confronto. A economia patina, o PIB começa a decrescer e o desemprego aumenta. As estruturas sociais e as relações pessoais se esgarçam e a violência torna-se banal. Apesar disso o povo está na rua e nas redes, o que é um bom sinal da vitalidade da vida democrática. Nunca foi tão intenso o interesse pela política e a participação do cidadão comum.
  Os principais problemas vêm do próprio presidente. Legitimamente eleito pelo voto, Bolsonaro não consegue governar. Falta-lhe programa, um ministério qualificado, capacidade de articulação política e liderança na sociedade.
  A sua “revolução conservadora” se assenta, principalmente, nos quatro cavaleiros do Apocalipse, os olavistas Weintraub (Educação), Ernesto Araújo (Relações Exteriores), Ricardo Salles (Meio Ambiente) e Damares Alves (Mulher, Família e Direitos Humanos).  A cada dia surgem novas maldades, principalmente contra a inteligência.
  Dentro do próprio governo, o clima é de beligerância, disputas e desconfianças. A autofagia é a regra, gerando constante instabilidade e paralisia administrativa.
  Desde a campanha, Bolsonaro usa a hostilidade como método de disputa. Recusa-se a dar adeus às armas. Recentemente, postou na rede uma dramática mensagem, dizendo ser impossível governar com o Congresso Nacional e suas práticas. Ora, esse problema só tem duas soluções: renúncia ou o fechamento do Congresso. Nesse clima foi convocada uma manifestação de rua, à qual o presidente acabou não comparecendo, num recuo tático.
           O resultado prático foi transformar seu principal aliado na Reforma da Previdência, Rodrigo Maia, em “pixuleco”. A hostilidade como método de governo tem levado o Presidente a derrubar pontes e a diminuir sua governabilidade.
  O Congresso que aí está, a despeito dos seus conhecidos problemas, é tão ou mais legítimo que o Presidente, pois se Executivo representa é maioria, o Legislativo é totalidade, é o campo da política e da negociação, sem a qual a democracia não sobrevive.
  Apesar dos conflitos o legislativo vem encaminhando as questões suscitadas pelo Governo Bolsonaro. A votação da Previdência já tem data marcada, escoimadas as maiores aberrações do projeto. A reforma administrativa já foi votada e aprovada, o pacote anticorrupção está esperando na fila. Dentro das regras democráticas, a política não está parada. Só não está funcionando o rolo compressor que governos sempre tentam fazer em cima do Congresso.
  O Supremo já teve melhores dias, mas andou perdendo prestígio na população, por excesso de disputas internas e de exposição midiática. Sempre se espera dos juízes atitudes sóbrias. Agora sofre nova deslegitimação, com o esdrúxulo protagonismo político de seu presidente, pelo “pacto”.
  A disputa real tem dois contendores centrais: o executivo e o legislativo. É desejável que se mantenham independentes e harmônicos, sem o cabresteamento do Legislativo pelo Executivo. Caberá à opinião pública pressioná-los, ambos, a cada dia, diante das ações nefastas que surgirem. Não será fácil, diante do programa de maldades, que Bolsonaro desenvolve a cada dia, mas esse será o caminho dos democratas.
  Que cada um cumpra os seu dever. O pacto que serve aos brasileiros é o da Constituição de 1988, sem aventuras nem quebra da legalidade.
Fausto Matto Grosso
Engenheiro Civil e professor aposentado da UFMS

sábado, 18 de maio de 2019


MANIFESTAÇÕES DAS UNIVERSIDADES
  Não foram poucas as críticas que já fiz às Universidades, mas todas elas tinham destino certo e revelavam uma posição de quem queria mais delas, não menos.
  Os ataques do Governo Bolsonaro às Universidades têm a intenção de amesquinhá-las. Revela puro “viés ideológico”, revanchismo, arrogância e despreparo dos últimos ministros da Educação. Acusam-nas de serem locais de “balburdia” e de “gente pelada". Em entrevista, o ministro Abraham Weintraub disse que sobrava dinheiro para “fazer bagunça e evento ridículo” - quando a verdadeira bagunça se dava no MEC, com o jogo político dos troca-trocas das cadeiras.
Discricionariamente, ameaçaram de redução do orçamento da UnB, da UFF e da UFBA. Pilhados nessa situação arbitrária e esdrúxula, anunciaram a extensão do contingenciamento de verbas para todas as Universidades Federais.
  Um fato que contraria a argumentação de Weintraub é que as três universidades citadas são bem avaliadas, tanto no Brasil quanto no exterior. Todas têm nota cinco, o valor máximo no desempenho do Índice Geral de Cursos (IGC) do próprio MEC.
  Sei perfeitamente diferenciar contingenciamento de recursos, de corte de verbas. Sou capaz, também, de identificar os irresponsáveis que levaram as finanças públicas do País ao atual descalabro. Mas, como diz o ex-Reitor da UnB professor José Geraldo de Sousa Junior “O governo não pode usar o fundamento público de gestão do orçamento para ações de represália, de castigo. Isso é desvio de finalidade. O MEC não é feitor das Universidades. Se tiver algo errado, tem de abrir inquérito e investigar. A estratégia encoberta é criminosa. É um crime de responsabilidade”.
  Essa medida do Governo ainda foi acompanhada da promessa de medidas contra os cursos da área de ciências humanas e cobrança de ensino. Em convocação na Câmara dos Deputados, o ministro ainda apontou como natural a intervenção de forças policiais nos campi universitários o que afronta uma das mais caras tradições democráticas, a da autonomia da Universidade, garantida no artigo 207 da Constituição.
  Como resultado de mais uma ação desastrada do MEC, na semana passada, em 170 cidades, incluindo todas as capitais, as ruas se encheram de protestos contra o arrocho na educação. Dando mais um tiro na própria testa, desde os EUA, Bolsonaro sentenciou que as manifestações eram coisas de "imbecis" e "idiotas úteis" usados como "massa de manobra".
  Por certo, havia entre os manifestantes militantes políticos de diversos movimentos, o que demonstra a grande amplitude do apoio à educação, também faixas inconvenientes e esdrúxulas, isso faz parte da democracia. Mas, milhares de manifestantes, de crianças a idosos, não tinham ligação com siglas e compareceram em participação espontânea que lembraram os protestos de 2013, quem sabe, antecipando a primavera.
  De certa forma, tudo isso já era esperado desde a campanha eleitoral. Agora que o governo patina na produção de resultados positivos na economia, o que vemos é o avanço na pauta do obscurantismo. A ofensiva contra a Universidade era questão de tempo. Se na respeitável Academia das Agulhas Negras ensinassem filosofia e sociologia, Bolsonaro não estaria tendo que alugar sua cabeça para um astro-porno-filósofo da Virgínia.
  O fato é que vivemos um quadro de autoritarismo e de obscurantismo. O pior, isso acontece em um momento em que o Governo precisa desarmar os espíritos, pois muita coisa está em jogo na política e na pauta do Congresso Nacional. Espero que o Presidente não esteja querendo, voluntariamente, incluir sua fotografia na galeria dos nossos presidentes breves, junto com Jânio Quadros, Color e Dilma Russef. Mais uma crise não faria bem ao País.
  Na semana passada, voltando da manifestação me veio à cabeça uma linha do tempo. Há quase 50 anos, minha geração de 1968 também lutava nas ruas contra a ditadura e em defesa da Universidade. É inegável, as ditaduras e os regimes autoritários têm raiva da inteligência, tem nojo do espírito crítico, prefere o silêncio dos cemitérios e os aplausos dos bajuladores acríticos.
Fausto Matto Grosso
Engenheiro e professor aposentado da UFMS


quinta-feira, 2 de maio de 2019


NOVA POLÍTICA DE BOLSONARO
  O Presidente Bolsonaro e o Presidente Rodrigo Maia, representam dois poderes importantes da República. 
  Embora tenham posições convergentes quanto à Reforma da Previdência, vez por outra, se estranham sobre os encaminhamentos dessa questão. Maia cobra maior articulação do governo, Bolsonaro retruca que já fez a sua parte e resiste ao que ele chama de “velha política”.  “Quero saber o que é a nova política” retruca o outro.
  As manifestações de 2013, durante o Governo Dilma, acenderam um sinal de alerta para a política tradicional. Mobilizados pelas mídias sociais, brasileiros gritavam nas ruas, “vocês não nos representam”.
  Era um amplo processo de contestação à pratica política tradicional no nosso País, caracterizada pela falta de postura ética, e de descompromisso programático dos diferentes partidos e lideranças políticas. Eram sinais claros de descrença na política.
  Nesse contexto, emergiram, na sociedade, diversos movimentos cívicos, organizados através de redes virtuais, especialmente dedicados à mobilização política da cidadania. Alguns deles se dedicavam, também, à formação de novas lideranças políticas para os processos eleitorais, no que lograram algum êxito nas eleições de 2018. Esse fenômeno aconteceu tanto no campo da direita ultraliberal como no centro democrático, neste caso, representando uma alternativa à polarização esquerda-direita.
  Antes disso, já vinha se fortalecido, entre alguns muitos atores da política, a percepção de que as mudanças civilizatórias, influenciadas pela globalização e pela revolução científica tecnológica, apontavam para um mundo mais complexo e mais plural, que impunha uma “nova política”, tendo como eixo uma nova relação dos partidos com os governos, com a sociedade civil e com a cidadania. Também para a adoção de novos padrões éticos na política.
  O que Bolsonaro tem com isso? Absolutamente nada!
  Bolsonaro foi deputado federal, com um único projeto aprovado ao longo de sete mandatos, entre 1991 e 2018, tendo passado por diferentes partidos ao longo de sua carreira. Era classificado como pertencente ao chamado “baixo clero” da Câmara dos Deputados. Conhecia e usufruía da velha política. 
  No último processo eleitoral, sentindo a revolta da população contra a política, o candidato Bolsonaro assumiu, em seu discurso, o papel de arauto da mudança. Só que ao fazer isso, se colocou numa armadilha, a de demonizar negociações políticas. Num sistema fragmentado como o nosso, a negociação é inevitável. Se ele insistir na sua estratégia de confrontação, o seu destino será o fracasso e o isolamento.
  A indecifrável “nova política” do Presidente está levando o governo a um impasse. No Congresso, a “mãe de todas as reformas”, a do sistema de Previdência do país, começou a correr risco.
  Teve então que começar a ceder à política realmente praticada, começando a usar os meios políticos disponíveis da "velha política", que ele tanto combateu na campanha e nos primeiros meses de governo. Exemplo disso é o próprio fato de que ele oferece R$ 40 milhões em emendas parlamentares – o que é jurídica e politicamente legítimo – para os deputados que votarem a favor da reforma.
  Teria sido possível algum outro caminho? Do jeito que está, isso tem baixa possibilidade. Tería que voltar muito atrás. Ter criado novas relações a partir de programa de governo, que aparenta não ter. A nova relação entre Governo e Parlamento, pretendida por Bolsonaro, não aponta para um repúdio às relações espúrias até então existentes, mas para uma simples afirmação da sua posição autocrática, que recusa dividir poder.
  Para Oswaldo Amaral, da Unicamp, com a intransigência de Bolsonaro, o governo pode não conseguir governar, e apenas continuarb “fazendo espuma nas redes sociais e nas pautas menos relevantes”.
FAUSTO MATTO GROSSO
Engenheiro civil. Professor aposentado da UFMS