quarta-feira, 28 de agosto de 1991

A GREVE DAS UNIVERSIDADES

(Jornal do Brasil Central 28/08/91)
Caminhando para completar 2 meses de, a greve nas 47 universidades federais continua esbarrando na insensibilidade do governo. Colocando limites claramente políticos o presidente Collor tem mantido o percentual de gastos com pessoal em torno de 37% da receita tributária da União. Os docentes reivindicam 149% de reposição salarial, mas o governo oferece reajuste médio de 60% quando poderia ir até 200%, sem ultrapassar o limite constitucional de 65% da receita com gastos com o funcionalismo.
È lógico que o Estado não pode existir apenas para pagar seus servidores, o movimento docente tem clara consciência disso. O limite de 65% ´e até tolerante demais nesse aspecto. Mas a necessária reforma do Estado, além de não poder ser projeto personalista de um governo só, não pode ser reduzida ao simples sucateamento e diminuição da máquina pública. Não pode haver “modernidade” com a dengue convivendo com a disponibilidade dos antigos funcionários da Sucam, tampouco com a vergonhosa incapacidade de fazermos o que acontece pela primeira vez, o censo demográfico docenal.
Há sim que se redirecionar e desprivatizar o Estado. Contabilizássemos as perdas de receita pública devidas aos incentivos ilegítimos, aos subsídios indecorosos, ‘a recessão premeditada quadro relativo dos gastos públicos seria sensivelmente alterado, os gastos com funcionalismo ficando dentro de percentuais bastante razoáveis que não inviabilizassem os investimentos em infra-estrutura e serviços públicos de boa qualidade.
Mas a política é outra , e isso tem que ficar aparentemente demonstrado para Os fiscais do FMI. Há que se arrochar para haver saldo em caixa para o pagamento dos banqueiros internacionais. Alguém mais preconceituoso poderia dizer que essa é a velha cantilena da esquerda, mas quem acompanha a atual negociação salarial sente claramente essa realidade no posicionamento dos negociadores oficiais. O limite é político é a de pagar a dívida externa, a qualquer preço.
O resultado disso será o sucateamento e destruição do que ainda existe de serviço público. No caso das Universidades , o quadro é ainda mais dramático. Considerando o próprio critério sacrossanto dos neo-liberais, o da idolatria do mercado, nenhuma Universidade conseguirá segurar seus quadros mais qualificados com tetos salariais que hoje não ultrapassam Cr$ 430 000,00 ( professor titular, doutor, com dedicação exclusiva ) e tampouco conseguirá tampar o rombo deixado pelo êxodo das melhores cabeças oferecendo, aos iniciantes de carreira, pisos salariais de Cr$ 57 190,00 bruto (professor auxiliar, graduado, 20horas ).
Com os tímidos reajustes anunciados e com os percentuais inflacionários esperados, em outubro, em termos reais , os salários já estarão nos níveis do início da greve.
O resultado dessa desastrosa política do governo Collor será a transformação da Universidade Brasileira em reino da mediocridade e da enganação. E , nos tempos de hoje, sem conhecimento, sem ciência sem tecnologia, o nosso destino, traçado pelo neo-liberalismo, será o de sairmos do terceiro mundo para ingressarmos no quarto mundo. Repetir-se-á mais uma vez o conto da caderneta de poupança. Se o Congresso Nacional deixar.

FAUSTO MATTO GROSSO

terça-feira, 20 de agosto de 1991

“UNIÃO SOVIÉTICA - GOLPE É O RETROCESSO”

( Diário da Serra – 20/08/91)
O Presidente do Diretório Regional do PCB, Fausto Matto Grosso, condenou o golpe encetado pela linha dura do Partido Comunista da União Soviética - PCUS. Para Fausto, sob nenhum argumento se justificaria a ruptura com a legalidade socialista . Considerou que, a persistir as restrições às liberdades existe a possibilidade da volta do clima de guerra fria e também de interrupção do processo de integração da URSS na economia internacional. O dirigente comunista considerou que os beneficiários do golpe foram aqueles que apostavam num clima de conflito nas relações internacionais. Abaixo a reprodução da entrevista.
Qual sua opinião sobre o golpe que derrubou o presidente soviético Mikhail Gorbachev?
Fausto – Esse, sem dúvida nenhuma representa um retrocesso no processo de construção da democracia socialista na União Soviética. Sob nenhum argumento se justificaria a ruptura com a legalidade socialista, tão duramente conquistada, e a gente não pode antever nenhum bom resultado como conseqüência dessa medida de força que foi tomada pelos setores mais conservadores do Partido Comunista da União Soviética.
Quais as conseqüências dessa posição de força assumida pela linha dura dos PCUS?
Fausto – A União Soviética enfrentava muitas dificuldades na sua política interna , na sua economia. A crise que ela vivia pôs a nu, inúmeras debilidades do processo de construção do socialismo e mostrou mesmo que em muitos aspectos o socialismo estava muito atrasado. Exemplo disso, foram as manifestações estreitas de nacionalismo de algumas repúblicas soviéticas, algumas manifestações atrasadas de populismo como as representadas pelo Presidente da Rússia, Boris Yeltsin, que representava o atraso político herdado por Gorbachev e que com muita dificuldade ele tentava administrar. Então as conseqüências serão sem dúvida nenhuma, a persistir essa política de restrição às liberdades , como anunciadas nos primeiros comunicados da junta que assumiu o poder , extremamente nocivas para o processo de recuperação econômica da União Soviética. È possível que seja recrudescido o clima de guerra fria , que o processo de integração da URSS na economia internacional, profundamente necessário, seja também dificultado e além também dos riscos para as conquistas democráticas que a Perestróika e a Glasnost tinham inaugurado naquele país.
O Iraque por exemplo, considerou como bem vindo o golpe encetado pela linha dura do PCUS. Quem são os beneficiários do golpe?
Fausto – Sem dúvida nenhuma quem apostava num clima de conflito nas relações internacionais saiu fortalecido nessa substituição que houve no governo da União Soviética. A gora a gente espera que seja um processo ainda reversível , porque há uma resistência democrática , embora muito influenciada por certas lideranças populistas. Torcemos por uma solução política que reconduza Gorbachev à liderança do processo como acho que todos que apostam em termos mundiais, pelo socialismo baseado na democracia , na liberdade o desejam também.
O PCB realmente estava de acordo com a Perestróika e a Glasnost , implantadas sob a liderança de Gorbachev?
Fausto - Nós estávamos de acordo, mas não de uma maneira reflexa . O nosso partido tem uma tradição de luta pela democracia, que fez com que a gente entendesse muito mais cedo, inclusive que o Partido Comunista da União Soviética, a importância dele não só como meio para atingir o socialismo , mas como um precípuo da nossa luta . Nós , há muito tempo que entendemos que não existe a possibilidade de socialismo, sem democracia. Muitas das mudanças que Gorbachev tentava fazer ao nível dos PCUS já constavam de posições do PCB, como ao próprio rompimento com a estrutura enrijecida do marxismo, criada pelo Stálin, enclausurando dentro de uma camisa de força toda a criatividade do pensamento de Marx e de Lênin naquilo que eles denominam marxismo-leninismo. O PCB já tinha feito essas mudanças no seu 9º Congresso. Então , nós achamos que a Perestróika e a Glasnost abriram novas perspectivas para o socialismo no mundo, e que longe de ser um sinal de fraqueza e de derrota desse ideal generoso, pelo qual tantos revolucionários no mundo inteiro, deram vida, significava exatamente a possibilidade de salvação do socialismo, fazendo com que ele se encontrasse com a democracia com a liberdade, com o pluralismo e com o humanismo.


FAUSTO MATTO GROSSO