terça-feira, 12 de outubro de 2010


Na eleição de 1985, Fernando Henrique Cardoso estava virtualmente eleito prefeito de São Paulo quando, na TV recebeu pergunta fatal feita pelo jornalista Bóris Casoy: “Você acredita em Deus?” Ao se declarar ateu, viu o resultado se alterar e, em seu lugar, tomou posse Jânio Quadros.

Já em 1994 FHC foi eleito Presidente da República sempre citando Deus nos seus discursos. Governou inaugurando obras com agradecimentos a Nossa Senhora Aparecida. Essa “conversão” lhe garantiu, também, a reeleição.

Fundamentalismo religioso é uma mistura explosiva entre religião e política. Consiste na interpretação literal de um texto tido como fundamental (tais como o Corão, o Talmud ou a Bíblia) que confere a seus guardiães autoridade máxima, diante da qual nenhuma outra autoridade pode ser invocada. A doutrina deve prevalecer sobre as leis das sociedades democráticas. Fundamentalismos, sejam de natureza religiosa, científica, ideológica, econômica, política ou de qualquer outra adjetivação, são fontes de intolerância e opressão. Não raro, de ditaduras.

A história do fundamentalismo religioso manchou de sangue a humanidade. Sejam as sangrentas Cruzadas contra os muçulmanos até o reverso atentado contra as torres gêmeas em Nova Iorque. As lutas fratricidas no Oriente Médio são provas inequívocas dos males da intolerância religiosa.

Giordano Bruno foi queimado na fogueira pelo crime de heresia na sua concepção astronômica. Também Galileu Galilei, ao defender que a Terra não era o centro do Universo, embora gravemente doente, foi chamado a Roma onde foi julgado pelos tribunais da Inquisição e condenado a renegar publicamente as suas concepções.

A eleição de 2010 se processa nesse nível de intolerância sectária, tendo como tema principal a questão do aborto. Os dois presidenciáveis já no primeiro programa do segundo turno se esmeraram explicitar posicionamentos “a favor da vida”, como se pudesse haver alguém civilizado que pudesse ser a favor da morte.

A principal atingida pelos Torquemadas requentados do século XXI foi Dilma Rousseff, que melhor se colocando quanto ao intrincado tema do aborto, apontando-o como uma questão de saúde pública, teve que recuar para uma posição defensiva e humilhante. Em seu socorro veio a Comissão Brasileira Justiça e Paz, da CNBB, com uma apropriada nota pública para condenar o uso da fé cristã no processo eleitoral. "Muitos grupos, em nome da fé cristã, têm criado dificuldades para o voto livre e consciente", diz a nota.

Quanto a José Serra, de que nada sei sua fé e não tenho o menor interesse em saber, postou-se mais dentro dos cânones da ortodoxia religiosa. Apenas fica a dúvida se foi o aprendizado com a nefasta experiência de FHC ou se tem coerência com a sua militância na esquerda católica nos anos 60. Nesse período Serra militou na Ação Popular, originária da Juventude Universitária Católica e da Juventude Operária Católica em companhia de Betinho e Sérgio Mota e José Travassos, entre os mais conhecidos.

O Brasil, felizmente, não tem entre os seus males a intolerância religiosa. Tomara que continue sempre assim. Já na Constituinte de 1946, Jorge Amado, deputado pelo Partido Comunista, foi o autor do dispositivo constitucional de descriminalizou os cultos africanos do candomblé e da umbanda, até então tratados como caso de polícia. Era um não crente em defesa da liberdade religiosa, dos direitos e da cultura dos negros pobres.


Obscurantismos a parte, precisamos é eleger um Presidente que tenha uma estatura de estadista comporte-se como tal, dê exemplos positivos para a sociedade, que seja o melhor para liderar a nação brasileira no enfrentamento dos seus problemas apontando valores para a construção do um mundo melhor. Com todo o respeito, não acho que devamos escolher alguém para ajudar na sacristia ou nos púlpitos das pregações.

Fausto Matto Grosso
Engenheiro, professor da UFMS
faustomt@terra.com.br
Jornal da Cidade - 11/10/2010

domingo, 10 de outubro de 2010

FUNDAMENTALISMO RELIGIOSO E HIPOCRISIA

Na eleição de 1985, Fernando Henrique Cardoso estava virtualmente eleito prefeito de São Paulo quando, na TV recebeu pergunta fatal feita pelo jornalista Bóris Casoy: “Você acredita em Deus?” Ao se declarar ateu, viu o resultado se alterar e, em seu lugar, tomou posse Jânio Quadros.
Já em 2004 FHC foi eleito Presidente da República sempre citando Deus nos seus discursos. Governou inaugurando obras com agradecimentos a Nossa Senhora Aparecida. Essa “conversão” lhe garantiu, também, a reeleição.
Fundamentalismo religioso é uma mistura explosiva entre religião e política. Consiste na interpretação literal de um texto tido como fundamental (tais como o Corão, o Talmud ou a Bíblia) que confere a seus guardiães autoridade máxima, diante da qual nenhuma outra autoridade pode ser invocada. A doutrina deve prevalecer sobre as leis das sociedades democráticas. Fundamentalismos, sejam de natureza religiosa, científica, ideológica, econômica, política ou de qualquer outra adjetivação, são fontes de intolerância e opressão. Não raro, de ditaduras.
A história do fundamentalismo religioso manchou de sangue a humanidade. Sejam as sangrentas Cruzadas contra os muçulmanos até o reverso atentado contra as torres gêmeas em Nova Iorque. As lutas fratricidas no Oriente Médio são provas inequívocas dos males da intolerância religiosa.
Giordano Bruno foi queimado na fogueira pelo crime de heresia na sua concepção astronômica. Também Galileu Galilei, ao defender que a Terra não era o centro do Universo, embora gravemente doente, foi chamado a Roma onde foi julgado pelos tribunais da Inquisição e condenado a renegar publicamente as suas concepções.
A eleição de 2010 se processa nesse nível de intolerância sectária, tendo como tema principal a questão do aborto. Os dois presidenciáveis já no primeiro programa do segundo turno se esmeraram explicitar posicionamentos “a favor da vida”, como se pudesse haver alguém civilizado que pudesse ser a favor da morte.
A principal atingida pelos Torquemadas requentados do século XXI foi Dilma Russeff, que melhor se colocando quanto ao intrincado tema do aborto, apontando-o como uma questão de saúde pública, teve que recuar para uma posição defensiva e humilhante. Em seu socorro veio a Comissão Brasileira Justiça e Paz, da CNBB, com uma apropriada nota pública para condenar o uso da fé cristã no processo eleitoral. "Muitos grupos, em nome da fé cristã, têm criado dificuldades para o voto livre e consciente", diz a nota.
Quanto a José Serra, de que nada sei sua fé e não tenho o menor interesse em saber, postou-se mais dentro dos cânones da ortodoxia religiosa. Apenas fica a dúvida se foi o aprendizado com a nefasta experiência de FHC ou se tem coerência com a sua militância na esquerda católica nos anos 60. Nesse período Serra militou na Ação Popular, originária da Juventude Universitária Católica e da Juventude Operária Católica em companhia de Betinho e Sérgio Mota e José Travassos, entre os mais conhecidos.
O Brasil, felizmente, não tem entre os seus males a intolerância religiosa. Tomara que continue sempre assim. Já na Constituinte de 1946, Jorge Amado, deputado pelo Partido Comunista, foi o autor do dispositivo constitucional de descriminalizou os cultos africanos do candomblé e da umbanda, até então tratados como caso de polícia. Era um não crente em defesa da liberdade religiosa, dos direitos e da cultura dos negros pobres.
Obscurantismos a parte, precisamos é eleger um Presidente que tenha uma estatura de estadista comporte-se como tal, dê exemplos positivos para a sociedade, que seja o melhor para liderar a nação brasileira no enfrentamento dos seus problemas apontando valores para a construção do um mundo melhor. Com todo o respeito, não acho que devamos escolher alguém para ajudar na sacristia ou nos púlpitos das pregações.

Fausto Matto Grosso
Engenheiro, professor da UFMS

faustomt@terra.com.br