A CRISE CUBANA
Não há como analisar Cuba sem se referir ao abominável
bloqueio imposto pelos Estados Unidos. Sua suspensão é parte da solução do
problema cubano. O bloqueio dos Estados Unidos é irresponsável e condenável, e
é um resquício dos tempos sombrios da Guerra Fria. Desde 1992, a Assembleia
Geral da ONU vota esmagadoramente pelo fim desse bloqueio.
Os EUA nunca se conformaram por ter perdido Cuba da sua área
de influência. Acham inaceitável um país socialista no seu quintal. Por isso,
logo após a vitória dos guerrilheiros de Sierra Maestra, tentaram invadir a
Ilha com tropas mercenárias. Foram derrotados em abril de 1961. No ano seguinte,
o presidente Kennedy decretou o bloqueio a Cuba, que perdura até hoje. Trump
determinou mais 243 novas medidas de bloqueio, até agora, não removidas por
Biden.
Mas é simplório e
negacionista o discurso do governo cubano, que busca responsabilizar exclusivamente
os americanos pela crise econômica e social do país. Ela tem raízes profundas
na história e na natureza do socialismo cubano.
Os manifestantes nas
ruas reclamam da escassez de alimentos e remédios, problemas antigos e
conhecidos. Reclamam dos apagões elétricos e mais recentemente denunciam o
baixo acesso à vacinação contra a Covid. A pandemia também zerou uma das
principais fontes de recursos do país, o turismo, fazendo com que a situação
interna se agravasse. Não há como negar como justas essas reclamações. Nunca
foi projeto do socialismo a igualdade na escassez.
Ao lado dos problemas reais, a internet se transformou em um
poderoso instrumento de irradiação do descontentamento, mas também de
organização e mobilização das manifestações.
Os cubanos clamam também por democracia e liberdade. Ou o
regime encontra o caminho de reformas econômicas e políticas ou corre o risco
de sucumbir. Ditaduras não são aceitáveis, nem as de direitas, tampouco as de
esquerda. O socialismo nas atuais condições do mundo só é possível se
incorporar uma nova plataforma que contemple a democracia, a liberdade e as
novas demandas contemporâneas da cidadania global.
Após a morte de Fidel e a aposentadoria de Raul, os
dirigentes cubanos iniciaram uma tímida flexibilização da economia e uma
renovação na estrutura de poder porque sabem que é inescapável e urgente
organizar uma transição do “socialismo real” para uma economia aberta ao
mercado e para um sistema político democrático.
É importante ressaltar que para que as mudanças ocorram é
imperiosa a suspensão do bloqueio. A pressão internacional sobre os Estados
Unidos precisa avançar, tanto na ONU como opinião pública mundial. A suspensão
do bloqueio fará com que Cuba se encontre com a sua verdade e avance nas
reformas.
No caso da União Soviética, as reformas de Gorbatchov não
chegaram a tempo, e o socialismo real desmoronou. A China reformou a economia,
mas não reformou a política. Em Cuba, o povo nas ruas pode catalisar o processo
de reformas, que já deveria ter ocorrido há quase 40 anos Não sei se Cuba
tentará fazê-las, e com a profundidade necessária e se terá tempo para isso.
FAUSTO MATTO GROSSO
Engenheiro e professor aposentado da UFMS
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