quinta-feira, 9 de julho de 1998

FILAS E EDUCAÇÃO

Conversava na semana passada com um antigo professor, trocando saudosas reminiscências a respeito do velho Colégio Estadual Campograndense, hoje Escola Maria Constança de Barros Machado.
Nos anos 60, época de ouro da nossa velha escola, ela era o única da rede estadual de 2o. grau em Campo Grande, tanto que era simplesmente conhecida como “Colégio Estadual”. Com suas 8 salas de aula, seus laboratórios, parecia-nos enorme para a época. Seu anfiteatro possuia uma área talvez maior do que o total das salas de aulas e era um dos mais importante da cidade. Seu pátio coberto abrigava toda sorte de atividades associativas. A arquitetura, com o seu arrojo e funcionalidade, inegavelmente sinalizava a visão progressista do respeitado arquiteto comunista Oscar Niemeyer.
Neste aspecto só havia um senão. Projetada para Corumbá, o projeto teve uma segunda implantação, não autorizada, em Campo Grande. Sem as adaptações à novo orientação do terreno, todo a genialidade do estudo de sombreamento e ventilação foi por água abaixo e funcionou ao contrário. Muitos anos depois fiquei sabendo que o velho arquiteto bufara de raiva ao ver a documentação fotográfica que lhe enviara.
Mas tudo isso é detalhe. O que de fundamental havia naquela época era o respeito e a valorização da escola pública. Seus professores tinham prestígio, reconhecimento social e, imagino, salários condizentes e garantidores de uma carreira estável. Em uma época em que a pequena extensão dessa rede de ensino representava a baixa escolaridade da população, as vagas da escola pública eram, no geral preenchidas e disputadas pelos filhos das camadas médias e das elites econômicas da sociedade. O poder, a decisão política eram então competentes para garantir a boa qualidade do ensino público, pois alí estavam os filhos das camadas sociais que lhes sustentavam.
Com a necessária expansão da escolaridade geral da população, a rede pública teve que expandir-se para abrigar a todos, nesse processo de democratização perdendo a qualidade. Com as camadas médias buscando a escola privada, o poder e a decisão política voltaram a ser incompetentes para garantir a qualidade do ensino público da escola das classes subalternas.
Para as camadas médias, beneficiária, durante um certo período, do processo de desenvolvimento excludente, isso não lhe dizia respeito. Ela tinha dinheiro para comprar o ensino privado, a saúde privada dos planos de saúde e a segurança privada dos guardas de quarteirão ou de portão. Aliás, embora nos doa, muitas vezes fazíamos isso com o dinheiro público proveniente da renúncia fiscal do imposto de renda sobre as despesas com o ensino e a saúde privados.
As filas mostradas pelas televisões durante as últimas semanas, quando se processam as matrículas escolares, estão mostrando que esse quadro está mudando nos últimos tempos. A política de restrição ao crescimento econômico, as dificuldades no mercado de trabalho, alargamento do processo de exclusão social, tem feito as camadas médias buscarem novamente a escola pública.
Formadora de opinião como é, quem sabe agora, pelo sofrimento na própria pele, as camadas médias voltem a fortalecer a exigência de ensino público universal, de qualidade.

FAUSTO MATTO GROSSO

Presidente Regional do PPS

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