quinta-feira, 10 de dezembro de 2020

 

(Um livro escrito página a página)

REATAMENTO COM CUBA



  Durante a ditadura, foram interrompidas as relações diplomáticas entre o Brasil e Cuba.  Nos anos 1980, havia forte pressão de opinião pública a favor do reatamento. Intelectuais, artistas e militantes políticos começaram a assumir a visita à ilha, ao retornarem ao Brasil, causando burburinhos nos aeroportos, como foi a detenção de Chico Buarque e do dissidente comunista Davi Capistrano Filho, que viria a ser prefeito de Santos.

  Trabalhava pela aproximação entre os dois países, o diplomata cubano Sérgio Cervantes, que atuava no Brasil nas relações comerciais, principalmente na área do café e do açúcar, encarregado do Departamento de Américas do PC Cubano.  Nesse período foi criada, no Rio de Janeiro, a Associação Cultural José Martí que trabalhava pela aproximação cultural entre os dois países.

  Em 1983 essa instituição organizou uma excursão político-cultural a Cuba, com cerca de quinze pessoas. Minha mulher e eu engrossávamos o grupo. Cada um de nós levava no colo um quadro para a Bienal de Havana. O meu era o de Cláudio Tozzi. Essa viagem rendeu 11 artigos em jornal local, com intuito de divulgar Cuba e incentivar a visita àquele país (http://faustomattogrosso.blogspot.com/1984/).

  Após passar pela estratégica Cidade do México, embarcávamos pela Cubana de Aviação com destino a Havana. Chegamos à Ilha em 29 de dezembro de 1983, para a comemoração do 25º ano da Revolução que ocorreria em 1º de janeiro de 1984.

  Ciceroneados por Sérgio Cervantes, que já nos aguardava, fomos recebidos com todas as atenções e honrarias, especialmente os dois vereadores que compunham a delegação, eu, do PCB, e o outro do MDB, o empresário Armando Raineri, de Marília, proprietário das Massas Raineri. Recepções, palestras, contato com brasileiros, com direito até a entrevista na Rádio Havana. O retorno também se deu pelo México.

  No aeroporto de Viracopos, tivemos que passar pela revista da Polícia Federal, de olho na possibilidade de assumir a ida a Cuba, dentro do espírito de causar confusão. Eu e minha mulher fomos sorteados para revista de bagagem. Ao perguntarem de onde vínhamos respondi que de Cuba. O policial federal me perguntou o que eu trazia, afirmei que só pequenas lembranças para presentes. Foi quando ele viu bem em cima das roupas um belo álbum ilustrado com o título de “Educação e Revolução”, que trazia para presentear o Secretário de Educação MS. Na sequencia me perguntou o que eu transava educação ou revolução? Respondi que um pouco de cada coisa. Nesse instante o policial que revistava outra mala gritou: epa! aqui tem uma coleção completa das obras de Lênin. Pronto, estava tudo no jeito para armarmos o barulho.

  Entretanto o primeiro policial me indagou se eu era de Campo Grande e se eu conhecia o Lúdio Coelho. Ele disse que era “coelho pobre” da família dos Coelhos ricos e que trabalhava ali para estudar na Unicamp. Disse que poderíamos passar sem problemas.

  Já estávamos embarcados no ônibus quando o “policial” que nos revistara estava saindo do plantão, convenientemente vestido com uma camisa do PT. Estragou minha confusão.

Fausto Matto Grosso

 

 

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