domingo, 19 de fevereiro de 1984

A REVOLUÇÃO NA EDUCAÇÃO

(Depoimento de Viagem IV – Jornal da Cidade 19/02/84)
“Há de ser el trabajo el gran pedagogo de la juventud”- Fidel
“Na escola tem que se aprender o manejo das forças com as quais na vida se haverá de lutar”- José Marti
Um dos primeiros problemas enfrentados e resolvidos pela Revolução Cubana foi a Educação. Durante o período em que estivemos na Ilha , pudemos constatar a amplitude e o resultado desse esforço, de que tanto se orgulha o cidadão cubano.
Cuba, antes de 1959 não era diferente dos demais países subdesenvolvidos e dependentes. Quase a metade da população em idade escolar estava fora do sistema educacional. Havia 1 milhão de analfabetos absolutos e mais de 1 milhão de semi-analfabetos. Entretanto, havia 10 000 professores sem escolas e sem possibilidades de trabalho.
A luta contra o analfabetismo, que já havia começado durante os combates na Serra Maestra, teve sua batalha decisiva em 1961 com a Campanha de Alfabetização. Foram mobilizadospara esta tarefa , 100 000 estudantes , 15 000 operários, 35 000 professores e 121 000 voluntários populares. Grande parte desses alfabetizadores , principalmente os estudantes, foram enviados para o campo onde o índice de analfabetismo era maior (41,7 por cento) . O índice geral era de 23 por cento. Após um ano de trabalho, Cuba foi transformada em “território livre do analfabetismo”, hoje reduzido a um residual de 3,9 por cento segundo dados oficiais aceitos pela UNESCO.
Tivemos a oportunidade de assistir um documentário cinematográfico sobre a Campanha de Alfabetização. Trens superlotados de estudantes , indo para o interior e sendo recebidos por multidões entusiasmadas. Jovens semblantes emocionados e empolgados pela tarefa que a revolução lhes confiava. Na volta , após a missão cumprida , recebidos como heróis nacionais, homenageados carinhosamente pela população, tal como dois anos antes haviam sido festejados os guerrilheiros da Serra Maestra.
Hoje o sistema educacional cubano apresenta invejável eficiência, colocando-se entre os mais adiantados do mundo: 98,3 por cento das crianças entre 6 e 12 anos freqüentam a escola; 98 por cento dos alunos que começam o curso primário concluem-no; o índice de aprovação nos diversos cursos nunca é menor que 95 por cento. Os planos de educação fixam como meta chegar ao ano 2000 com toda a população cubana ostentando uma escolarização mínima de 14 anos de estudos.
A educação geral compõem-se de pré-escola (2 anos), primário (6 anos), secundário básico (3 anos) e pré-universitário (3 anos). A seleção para a universidade não é feita em um único exame vestibular, mas sim por um sistema de avaliação durante os três anos do pré-universitário. O aluno pode se inscrever para 10 opções de cursos e é enquadrado de acordo com a sua contagem de pontos. O curso superior dura de 4 a 11 anos, dependendo da ‘área de formação. Como alternativa ao curso pré-universitário, existem os cursos técnicos e profissionais, onde passa grande parte de força de trabalho do país.
O estudo é profundamente vinculado com o trabalho produtivo. Nas escolas primárias os alunos dedicam-se ‘a horticultura. No secundário ‘as atividades agrícolas(normalmente as escolas secundárias são no campo). Nos cursos de formação de professores dedicam-se ‘a prática didática. No ensino técnico profissional e no superior, pratica-se o trabalho especializado na área para a qual se está formando. Apesar disso, para evitar que o estudante se desvie dos estudos, é proibido por lei a remuneração de menores de 17 anos.
Esta ligação do estudo com o trabalho, além de atender a objetivos ideológicos (o trabalho desalienado é fonte de afirmação do ser humano), de romper a tradicional contradição entre a teoria e a prática e jogar por terra o conceito elitista de trabalho intelectual desligado da produção material, tem também u objetivo econômico. Diz Fidel que “ um país pobre, com a velha concepção de educação, teria que optar pelo princípio de que só estuda uma parte da população e condenar a maioria a não estudar. Para nós, a ligação do estudo com o trabalho produtivo além de ser um princípio de ordem moral, de um princípio de ordem teórica, além de tudo é uma imperiosa necessidade material.”
A aplicação desses princípios vimos em nossa visita a Escola Vocacional Lenin. Esta escola, situada a uns 30 Km de Havana , dentro de um parque de 750 há(Parque Lenin), oferece ensino secundário a cerca de quatro mil alunos em regime de internato. Os estudantes, rapazes e moças, chegam á escola no Domingo á noite e voltam para suas casas na Sexta-feira á tarde .
A escola, muito bem montada, com modernas instalações, teve seus quase 80 laboratórios doados pela União Sovética e foi inaugurada pessoalmente por Leonid Brejnev. É composta de cerca de 30 edifícios que se esparramam por vastos jardins bem cuidados e com toda uma estrutura para a vida social dos estudantes: centros de lazer, quadras de esportes, piscinas, bibliotecas, salões para cinema e teatro, etc.
Os alunos da Escola Lenin, dedicam-se em média 15 horas semanais ao trabalho produtivo em uma das três fábricas implantadas no conjunto educacional. Uma fábrica de material esportivo (produz tacos de baseball, bolas, redes, raquetes etc.) outra de roupas e uma de material e equipamento eletrônico onde se fabrica pilhas, monta-se rádios e computadores . A produção dessas indústrias garante auto-suficiência de todo o conjunto educacional.
Os estudantes com os quais conversamos nessa escola impressionaram-nos pelo nível de informação e pela cordialidade e desinibição nos contatos com os visitantes. Falavam-nos de suas preocupações com a paz mundial, de seus planos de estudos, perguntavam-nos sobre Zico, Sócrates e Roberto Carlos, narravam-nos os hábitos do internato (proibido cabelo grande e namoro ostensivo) e eram unânimes em um ponto: todos almejavam pertencer à Juventude Comunista.
Na cidade de Havana também visitamos várias escolas do bairro El Vedado, onde ficava nosso hotel. A maioria delas, de curso primário, é instalada nos antigos casarões da alta burguesia cubana que abandonou o país após a revolução. As salas de aula são pequenas, com atenção intensiva dos professores aos alunos e abundância de material didático. Sempre presentes em todas as salas, cartazes alusivos á revolução e de homenagem a seus heróis.
Além da educação formal, pudemos sentir grande ênfase na complementação cultural da juventude. No ano de 1984, devem ser produzidos em Cuba, 50 milhões de livros, ou seja, 5 volumes para cada cidadão cubano, isto sem contar a grande quantidade de livros importados, principalmente da União Soviética. Os ingressos de cinema, teatro e balé são baratíssimos, custam o mesmo que uma passagem de ônibus (50 cruzeiros). As bibliotecas são numerosas e as livrarias vendem seus livros a preços baixíssimos . O esporte e a formação física recebem toda a atenção e não é por acaso que Cuba vem se destacando em todas as grandes competições de nível internacional.
Cuba conseguiu colocar na prática a priorização á educação e hoje colhe os bons frutos dessa política. Conta com um povo preparado para o trabalho, desalienado, engajado social e politicamente, ou seja, em condições de enfrentar de forma competente, consciente e criadora a construção de sua sociedade socialista.

FAUSTO MATOGROSSO

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