sexta-feira, 6 de junho de 2014

PRECISA-SE DE NOVOS POLÍTICOS

Somente uma nova política pode dar solução ao esgotamento dos valores decadentes da velha política, essa que anda apedrejada pelas ruas e pelas praças. Para essa nova política, precisamos políticos de outra natureza, profundamente diferente.
Oriundo de uma militância política em partido clandestino, a noção da relação entre participação política, mandato e poder não foi de um aprendizado fácil para mim e para muitos da minha geração. Participar politicamente significava defender ideias, divulgá-las na sociedade, nas suas organizações e ajudar as pessoas a se organizarem em torno das suas lutas.
O importante eram as ideias, não os líderes e mandatários. Lembro-me perfeitamente, no “Partidão”, como nos regozijávamos quando outras lideranças, mesmo fora das nossas fileiras, como aliados ou simpatizantes, as adotavam. Isso nos bastava, a fertilidade das nossas propostas.
A ilegalidade nos impunha essa racionalidade e, talvez até, a tenhamos conservado para além do tempo razoável, mas esse foi um pouco da nossa história. Ter pretensões eleitorais próprias, durante muito tempo, era uma coisa mal vista entre nós, era considerada um espúrio sinal de “carreirismo”. Quando o avanço da democracia foi nos tornando possível exercer mandatos, esse era considerado uma missão, um encargo de representação. Lembro-me da minha primeira candidatura, Fiquei sabendo que seria candidato durante a nossa conferência eleitoral, que antecedeu a convenção do PMDB. O partido precisava de alguém com o meu perfil.
Parece que falo de um outro mundo, de um outro país. Especialmente os jovens, olhando a realidade da degradação política de hoje, devem estar pasmos, ou me achando maluco, ao ficar sabendo que isso já aconteceu na história do Brasil. Já houve um tempo em que a vereança era um cargo honorário, que políticos, às vezes poderosos, terminaram a vida modestamente. Que partido era partido e que mudar de partido era incorrer em uma condenação moral grave, eram os “traíras”. Política era para os mais respeitados, para aqueles de maior representatividade, e não para os mais ousados que se atiram à política para se aproveitar desta, não raro se tornando, da noite para o dia, homens miraculosamente ricos, donos de fortunas inexplicáveis.
Destruir a tradição partidária do país e estabelecer um fosso entre as gerações, talvez seja o pior desserviço da ditadura de 20 anos, o de abastardar a política, ao proibir as ideias, ao transformar os partidos em simples correias de transmissão do poder ou naquilo que, mesmo nascendo na oposição acaba mostrando que pretende apenas trocar de sinal para fazer a mesma política contra a qual insinuavam lutar. Paralelamente surgem aquelas outras agremiações, criados de ocasião, de encomenda, doadas de “porteira fechada” a chefetes locais, para negócios pessoais, ou para o jogo de alianças subalternas.
Surgiu o político autônomo, o político de mercado, representando o vazio ideológico que se formou no país. Fortaleceu-se a tal da “classe política”, uma excrescência conceitual ou a consciente formação de uma corporação voltada para si, para seus privilégios tendo como principal regra a da eterna perpetuação nos cargos, a qualquer custo.
Tenho convicção da impossibilidade de uma generalização dessa natureza, mas tenho, também, a convicção de que essa é a moda estatística flagrante que caracteriza a política real. Sei também o quanto desse comportamento é resultante das regras do sistema político-eleitoral. Mas cabe aos homens e aos políticos reformularem as regras perniciosas desse jogo político. Talvez a próxima eleição possa avançar na direção daqueles líderes que sinalizem e que se comprometam com as reformas necessárias e com a postura hígida desejável, para que a política possa vir a reconquistar o respeito que deveria merecer da sociedade.

Fausto Matto Grosso
Engenheiro e professor da UFMS, aposentado.

06.06.2014

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