quinta-feira, 4 de junho de 1998

ESQUERDA E REFORMAS

O processo eleitoral em curso propõe um desafio à cultura política da esquerda. Para que ela se capacite a respondê-lo é necessário que, inicialmente, entenda o recado das urnas de 1994. A eleição de FHC foi a vitória de um projeto de reformas contra uma esquerda tímida e acuada que, envolvida com a sua crise ideológica, mostrava-se incapaz de livrar-se da visão estatista e corporativista.
O Estado brasileiro, tal com se encontrava, era incapaz de ser indutor de um novo ciclo de desenvolvimento para o País. Moldado pela classes dominantes para o ciclo de substituições de importações, tornara-se anacrônico, privatizado pelas elites e pelas corporações, perdera a sua capacidade de financiamento, e era fonte permanente de inflação que atingia com toda a sua carga pesada os assalariados de baixa renda.
O projeto FHC correspondeu a uma iniciativa dessas mesmas classes dominantes de reformar o Estado segundo seus propósitos e interesse, vinculada aos propósitos dos centros financeiros mundiais. O neo-liberalismo era a receita por elas encomendada e passada ao novo presidente.
Manter-se imóvel ou na defensiva do status quo era derrota certa. A esquerda mostrou-se conservadora e entregou a bandeira das reformas para a direita, quando até a cultura do futebol já nos ensinava que seleção que não faz gol, leva.
Faltou à esquerda um projeto de reformas, formulado a partir de seus compromissos transformadores, éticos e libertários, que pudesse ser confrontado com o projeto de centro-direita e ajudasse a forjar a base de uma aliança de centro esquerda.
Realizar esse desafio é, na atualidade, o papel da candidatura Ciro Gomes.
No plano parlamentar urge também uma articulação da esquerda democrática em favor das reformas. Nesse sentido a experiência da Constituinte de 88 trouxe um importante subsídio de como se viabiliza tal desafio. Também minoritária, a esquerda, naquela ocasião foi capaz de romper o isolamento e, amparada na mobilização popular, forjar as aliança táticas que permitiram o isolamento do Centrão e a produção de uma Constituição avançada. Partiu p'ra cima e fez gol.
Já no presente processo eleitoral a esquerda deve pautar a luta pelas reformas. Isso permitirá legitimação nas urnas dessa proposta e a eleição de um base parlamentar suficientemente forte para realizá-la.
Lideranças como Roberto Freire, José Genoíno, Eduardo Jorge e tantas outras de igual naipe também existentes no PSDB, PMDB e PDT poderão ser aglutinadoras de uma frente parlamentar de centro-esquerda, capaz de formular, no parlamento, um projeto de reformas para desprivatizar o Estado, torná-lo indutor de um novo ciclo de desenvolvimento, e fazê-lo competente para enfrentar a exclusão social e a crise ética da contemporaneidade.

FAUSTO MATTO GROSSO
Engenheiro civil e professor da UFMS
Presidente do PPS/MS

04/06/98

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