terça-feira, 24 de novembro de 2020

 (um livro escrito pagina por página)

QUANTO VALE A TUA FAZENDA?

 


  O ano de 1982 teve grande importância para a legalização do PCB. No início do ano havia sido lançada a convocação para o “Encontro Nacional pela Legalização do PCB”, nome que encobria a realização do VIIº Congresso do partido.

  A partir dos primeiros meses foram sendo realizados eventos municipais e estaduais, com discussões das teses congressuais e escolha de delegados para as instâncias superiores.

  Havia 16 anos que o partido não realizava congressos dada a situação de perseguição e clandestinidade. Com isso vários conflitos internos estavam represados. O partido estava dividido em três correntes básicas, a prestista, que acabou não comparecendo ao congresso, o que significou o afastamento definitivo de Prestes da organização; a tendência leninista, liderada pelo secretário geral Giocondo Dias e a tendência eurocomunista liderada por Armênio Guedes e David Capristano inspirada nas teorias de Antônio Gramsci.

O VIIº Congresso seria o âmbito para essa disputa. Era, portando, um evento muito esperado. Mas, em 13 de dezembro de 1982 a Polícia Federal, comandada pelo delegado Romeu Tuma, invadiu o recinto da Editora Novos Rumos / Jornal Voz da Unidade, em São Paulo, onde se realizava o evento semiclandestino, impedindo a sua realização.          Foram presos 47 delegados 42 funcionários e dois garçons. Foi aberto inquéritos contra 40 pessoas, enquadrando-as na Lei de Segurança Nacional.

Entres os delegados, Mato Grosso do Sul tinha seu representante, o advogado Onofre da Costa Lima Filho. Estava presente também Expedito Rocha, (nome de guerra Tibúrcio) dirigente, do Comitê Central, que estava escondido na região de São Gabriel do Oeste (MS) plantando café.

Ainda no recinto do encontro, o tenente-aviador Dinarco Reis, que lutara na Guerra Civil Espanhola e na Resistencia Francesa (condecorado com a Legião de Honra da França), ao ser perguntado sobre de quem era uma pasta cheia de documentos encontrada no local, gritou: se tiver dinheiro é minha!

No momento da invasão do recinto, Tibúrcio que estava no banheiro, não percebeu nada de anormal. Quando lhe encostaram uma arma nas costas teria reagido instintivamente e desarmado o policial, invertendo a situação.

Ainda na fase da identificação no inquérito, nosso camarada Onofre foi inquirido sobre o que fazia na vida, ao que respondeu que era advogado e pecuarista. Diante da resposta inusitada o policial perguntou quanto ele ganhava como advogado, dito os valores, o policial perguntou como ele, com aqueles rendimentos estava metido com o comunismo. Onofre reagiu invertendo a pergunta, dizendo que era ele que estranhava que o policial com seu soldo pouco estar metido com o capitalismo. Depois o escrivão perguntou quanto valia a sua fazenda. Dada a resposta, Onofre olhou por cima dos seus ombros do escrivão e ironizou: “estão faltando três zeros”. Onofre, no processo, teve como testemunha de defesa o poderoso Senador Saldanha Derzi.

Ser comunista às vezes não era fácil, mas a vida nos reserva alguns momentos de divertidas situações.

Fausto Matto Grosso




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