ZERO PARA O PROVÃO
No
próximo domingo 45 mil formandos de engenharia, de administração e
de direito estarão indo às provas. Segundo o MEC o objetivo desse
exame é o de fornecer elementos para a avaliação das
Universidades. Após intenso e falacioso trabalho de mídia, este
processo, aos olhos da opinião pública, aparenta ser altamente
legítimo. Entretanto esta aparência não resiste a uma mínima
discussão. Por isso o Governo lançou o “provão” através de
mais uma medida provisória, criando uma situação de fato que, pela
tradição, nosso Congresso, subserviente, não tem sido capaz de
desmanchar.
Hoje,
transformada em lei, o “provão” sofre severas críticas nas
Universidades. Contra ela se manifestou o Conselho de Reitores, a
Associação dos Reitores da Universidade Federais, os Colegiados
Superiores das principais universidades brasileiras (como a USP), a
UNE e quase toda a opinião universitária.
Antes
de mais nada é importante salientar que este governo sabe tudo sobre
Universidade. Sabe de todos os nossos pontos fracos. A origem do
Presidente e de outros quadros ilustres dos ministérios nos dão
esta certeza. A Universidade está devendo à sociedade em questão
de transparência e avaliação. O governo sabe disso e usa então
tal fato para isolá-la politicamente e golpeá-la com uma avaliação
que não avalia nada e tem objetivos escusos.
É
impossível avaliar um conjunto de alunos, com uma única prova de
três horas. O próprio vestibular, com todas as suas imperfeições,
faz isso com pelo menos 4 provas de três horas. Aliás é
importante recordar que o Ministro da Educação, no início de sua
gestão, apontava que o vestibular deveria ser processual, ou seja,
avaliar os alunos no decorrer do segundo grau, como,
experimentalmente está fazendo a UnB.
Há
hoje uma diversidade muito grande de currículos de cursos que
oferecem a mesma habilitação, sendo que a parte do currículo
mínimo (que é objeto do provão) é geralmente um sub-conjunto
muito menor do que de fato é ensinado nas boas universidades.
Avaliar com a mesma prova, todos as Universidades é nivelar por
baixo, e o que é pior, em cima de conteúdos fixados há mais de 20
anos, pelo menos.
Segundo
a orientação do MEC, tomando o caso a engenharia, a avaliação
conterá uma série de “questões abertas, que contemplem situações
usuais da Engenharia Civil e permitam a avaliação de problemas e
proposição de soluções..” Ora, qualquer engenheiro sabe que
um problema real de engenharia não admite solução única e, neste
caso, considerando o conjunto de engenheirandos a serem avaliados,
cada grupo será avaliado por pessoas e por critérios diferentes, o
que inviabilizaria qualquer comparação entre as instituições.
O
governo diz que o exame nacional de cursos é apenas um entre outros
instrumentos de avaliação que serão usados. Mas cadê os outros ?
O MEC só começou a usar este argumento após ser ridicularizado
nas suas pretensões de avaliar universidades com prova de seus
alunos.
Está
claro para as Universidades que alunos e instituições não podem
ser avaliados como uma fábrica avalia a qualidade dos parafusos que
produz. Quem quer avaliar para conhecer problemas e corrigi-los tem
que avaliar os processos e não os produtos finais. As Universidades
precisam ser avaliadas na sua produção científica, na adequação
dos seus cursos às necessidades da sociedade, nas suas condições
materiais de funcionamento (laboratórios, equipamentos, instalações,
) nas condições oferecidas aos seus recursos humanos (salários,
incentivos, reconhecimento social, etc). A verdadeira avaliação
universitária é um processo extremamente complexo, que nem de longe
é atendida pelo exame nacional de cursos.
Enfim,
seria possível elencar uma infinidades de críticas técnicas ao
provão, como já consta de inúmeros documentos universitários
oficiais. Entretanto, mais importante é identificar os verdadeiros
propósitos políticos dessa medida.
A
história recente da Universidade mostra que desde o tempo em que o
PFL era dono absoluto do Ministério da Educação (Marco Maciel,
Jorge Bornhausen, Hugo Napoleão, etc), passando pelo período
Collor (Goldemberg), existe a idéia fixa de diferenciar as
instituições universitárias. Algumas continuariam como tais.,
outras seriam descredenciadas transformando-se em simples escolas do
terceiro grau.
Mas
o que sempre foi um idéia (repudiada) começa a tornar forma
concreta no governo FHC. A superficialidade e a pressa da avaliação
que propõe só pode ter uma explicação: documento recente do
Banco Mundial sobre a educação superior no Brasil sugere, com todas
as letras, que não podemos continuar com todas as instituições
universitárias sendo multifuncionais (ensino, pesquisa e extensão -
como prevê nossa Constituição) bem como indica a cobrança de
anuidades como fonte para a manutenção das universidades.
Isto
significa que algumas poucas instituições continuariam
universidades e as outras seriam descredenciadas. As primeiras
seriam aquelas que já tem produção científica importante. Quem
já estivesse bem seria privilegiada com recursos (aquelas dos
centros mais desenvolvidos). As da “periferia”, como a nossa
UFMS, estariam condenadas a ser simples instituições de ensino,
incapacitadas de produzir ciência e tecnologia para o nosso
desenvolvimento regional.
Esse
governo que “sabe tudo” não consegue olhar nos olhos da
Universidade Brasileira quando discute avaliação. Porque a sua
mascara, para nós, já caiu.
O
“provão”, embora ele negue, é para fazer o “ranking” das
Universidades para depois diferenciá-las com recursos e status
institucional. Aí, convenhamos, o “ranking” da Playboy é mais
interessante.
FAUSTO
MATTO GROSSO
Engenheiro
Civil, professor da UFMS
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