PATRIMONIALISMO
A
aprovação, pelo Plenário do Senado, da Medida Provisória que cria
2793 cargos comissionados na Casa Civil da Presidência, o apelidado
“trem da alegria do PT”, chama a atenção para um problema bem
maior, de natureza estrutural.
Desde
Collor, justificado pela ideologia do “Estado Mínimo”, o serviço
público vem sendo paulatinamente desmontado no País.Vivi isso, de
corpo presente, na Universidade e também durante o ano passado em
Brasília.
Na
Secretaria de Desenvolvimento do Centro-Oeste, onde trabalhava, o
único funcionário do quadro efetivo, era a copeira. Os demais eram
ou terceirizados (em alguns casos isso pode ser justificável), ou
contratados temporariamente via convênios de cooperação técnica
com organismos internacionais (artifícios para fugir dos concursos
públicos) ou ainda eram ocupantes de cargos comissionados, de livre
provimento, os famigerados “cargos de confiança”.
Portanto
não se deve discutir a Medida Provisória focando na falsa questão
do inchaço dos cofres do PT pela contribuição partidária
obrigatória do filiados que preenchesse tais “cargos de
confiança”. O que é chave nessa discussão é o reflexo dessa
disfunção na qualidade da administração pública.
A
análise é clássica. A capacidade de governo tende a aumentar com o
tempo. O governante só consegue governar, efetivamente, após a sua
maquina administrativa atingir um mínimo de maturidade. Antes disso
o dirigente aperta o botão e não acontece nada. Esse parece ser
ainda o estágio da atual administração – o governo aparenta não
ter começado. O simbolismo usado pelo PFL de comemorar o
aniversário do governo com um bolo com só dois terços, embora
cruel é impecável.
Contrariamente
a isso, os governantes costumam começar a gestão com seu nível
máximo de apoio. Afinal, a opinião pública acabou de se
manifestar a seu favor, a oposição fica cuidadosa para não
enfrentar esse sentimento majoritário, enfim, todo mundo dá um voto
de confiança ou pelo menos “um tempo”. Essa governabilidade
tende a cair ao longo do tempo. Aproximando-se das eleições,
complica-se mais a obtenção de apoio geral. Existe um mínimo de
governabilidade que diz quando o governo acabou, que não tem mais
condição política para tomar iniciativas.
Essa
contradição temporal entre a capacidade de governo e a
governabilidade faz com que o tempo eficaz de governo não seja de
quatro anos e sim bem menos. Obter o mais rapidamente possível
capacidade de governo é o desafio chave. Obviamente isso não se
consegue com mudanças radicais nos quadro “técnicos” da
administração.
O
quadro da Administração Pública tem que ser profissionalizado em
nível máximo possível. Isso é que vai garantir o acúmulo da
experiência e a consolidação de uma cultura administrativa que
garanta resultados.A falta de resultados do Governo atual tem muito a
ver com a descontinuidade administrativa provocada pela substituição
radical dos “cargos de confiança”. Aí é que “mora o perigo”:
democracia sem resultados não se sustenta.
Via
redução drástica dos cargos de livre nomeação e a realização
de concursos públicos combinados com avaliações permanentes de
desempenho, tem que ser consolidado um serviço público profissional
que independa dos governantes de plantão. Tais servidores o são do
público e não dos governantes. Esse é o imperativo republicano a
que devem se submeter os governantes.
Além
do mais, convenhamos, chamar cargos comissionados de “cargos de
confiança” expressa um patrimonialismo inaceitável em qualquer
político com compromisso democrático e republicano.
FAUSTO
MATTO GROSSO
Engenheiro
Civil e Professor da UFMS
1º
de maio de 2004
Nenhum comentário:
Postar um comentário