NÃO VAMOS QUEBRAR NOSSAS MÁQUINAS
No
início da Revolução Industrial os operários, tentando resistir a
opressão, reagiam quebrando as máquinas (Luddismo) como se fossem
elas a causa de sua desgraça. Levou algum tempo para que o movimento
dos trabalhadores percebesse o erro e apontasse formas adequadas de
lutas econômicas e principalmente percebesse a necessidade da luta
política pela propriedade social dos meios de produção.
Os
professores universitários, nas suas lutas demoravam um certo tempo
para se assumirem como trabalhadores, trabalhadores intelectuais. E
quando o fizeram, trataram de copiar as formas da luta sindical dos
trabalhadores industriais. Aí surgiu ontem entre nós a greve como
forma de luta econômica.
Temos
bastante claro que essa forma de luta, entretanto, tem para nós
algumas particularidades que não podem ser desprezadas.
Enquanto
a greve, que paralisa a fábrica, causa prejuízo ao trabalhador
(perda do salário), muito maior é o prejuízo do patrão. Isto é
que o obriga a negociar e ceder. Nesse caso é um risco calculado,
pois o movimento, se não forte, pode gerar a perda do salário e do
emprego. Daí o seu uso só quando esgotadas todas as outras
possibilidades.
Para
os professores universitários a situação é entretanto bastante
diferente. A greve como arma na luta econômica não é tão
eficiente. Se, em princípio, não ameaça nosso emprego, também não
causa prejuízo econômico direto ao empregador. Daí as greves de
tempo sempre demorado de duração.
Além
disso, nosso trabalho intelectual tem características muito
especiais. É um trabalho, no geral, desalienado, que desenvolvemos
construindo a nós mesmos. Para uma pesquisa, um programa de estudo,
uma elaboração de projeto para financiamento é como cortar a nossa
própria carne. Interromper nossas aulas ou nossos projetos de
extensão é como tomar terceiros, que poderiam ser nossos aliados,
como reféns, na nossa luta contra o governo.
Por
isso é imperioso dar um salto de qualidade em nossa luta e perceber
que o maior prejuízo que podemos causar em nosso empregador é o
prejuízo político. Temos que buscar formas que lhe desnudem o pouco
caso com que tratam a educação e o trabalho. A essência da nossa
luta deve ser, portanto, a pressão política.
É
ai que surgem contradições terríveis em nossas formas tradicionais
de luta. As greves, na realidade, esvaziam a Universidade (de
professores, técnicos e estudantes), diminuindo a possibilidade de
ações políticas massivas.
Também
problematizam nossas ligações com a sociedade, imprescindiveis para
que nossa luta, de caráter político, possa surtir efeito. Só não
percebe isto o corporativismo, verdadeira doença do infantilismo
político que grassa entre nós. A luta política, para dar
resultados, necessita de alianças, de amplitude, de construção de
hegemonia. Portanto nada que nos isola serve aos nossos propósitos.
Essas
reflexões que fazemos, e nós sempre estivemos solidários na luta
do movimento docente, não tem nenhum sentido desmobilizador. Pelo
contrário, buscam tensionar nosso movimento e nossa criatividade
para encontrarmos formas alternativas de luta, mais eficientes. Que
não nos isole do contexto social.
Ficarmos
apenas nesses comentários genéricos significariam pouca
contribuição.
No
contexto de uma greve já deflagrada (se assim não fosse, outras
alternativas poderiam ser discutidas), apontamos a necessidade de
analisar algumas outras possibilidades:
a)
Greve por tempo determinado curto (sucessivas se necessário). Esse
tipo de proposta já surgiu em nossas assembléias e tem o mérito de
minimizar o esvaziamento da Universidade, garantir assembléias com
maior presença e buscar sintonia permanente entre a vontade de luta
da nossa base e posição de nossos delegados e entidades;
b)
Diante de perspectiva de longa duração, adotarmos a greve
intermitente (em dias alternados) que teria o mérito de não
permitir o esvaziamento da Universidade, principalmente estudantes,
garantindo base de apoio para nossas ações políticas, além de
reduzir pela metade nossas reposições de aula e atividades
acadêmicas (o que só mentalidades de completa irresponsabilidade
social pensam em não fazer).
c)
Não interrupção de atividades que liguem a Universidade a
sociedade. É aqui que devemos dar o sinal mais claro de
amadurecimento, de ruptura com o corporativismo e de afirmação do
caráter político da nossa luta. Devemos manter em funcionamento
absolutamente normal o Hospital Universitário, o Teatro Glauce
Rocha, o Estádio e tantos outros projetos à comunidade. E devemos
fazê-lo assumindo que tais atividades servem à nossa luta por
estarem servindo à sociedade e ampliando, portanto, a nossa,
legitimidade social.
Esperamos
que estas reflexões possam contribuir para dar nova qualidade ao
nosso movimento. Não recusemos o desafio de repensar nossas formas
de luta. Não façamos greve contra nós mesmos. Não façamos greve
contra a sociedade. Não recusemos o desafio de construir nossa
hegemonia política. Não vamos, já no final do século XX,
continuar a quebrar as nossas “máquinas”.
(Prof.
Fausto Matto Grosso)
Jornal
da Adufms
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