quinta-feira, 29 de outubro de 2020

 

(Construindo um livro pagina a página)

AS ARMAS DO PARTIDÃO



  Durante muito tempo, as forças de segurança procuraram descobrir o poderoso arsenal do Partidão. Na verdade, isso não existia. Desde 1958, quando fizemos nosso acerto de contas com o stalinismo, passamos a adotar a concepção de via democrática para o socialismo.

  A propósito, nosso vereador Rádio Maia, em Campo Grande, nos anos 70, foi peremptório quanto à questão. Depois de algum tempo preso, mandou chamar o capitão que pronto chegou para as anotações. Um tremendo gozador foi dizendo que não sabia das nossas armas, mas que sabia de outras. Começou então a declamar os Lusíadas: “As armas e os barões assinalados, Que da ocidental praia Lusitana,...

  Muitos anos depois durante uma reunião na fazenda do camarada, Onofre, em Indubrasil, reparei duas whinchesters enfeitando a parede, velhas e enferrujadas. Argumentei que seria só para o caso de uma eventual autodefesa e saí de lá com as duas debaixo dos braços. Limpas, engraxadas, faziam inveja a qualquer colecionador.

  Quando vereador do PCB, andei andando com um Taurus 38, de cano médio, dentro da pasta. Meu receio era sofrer alguma tentativa de humilhação por parte de algum reacionário, pela minha condição partidária. Logo isso também se tornou desnecessário, e misteriosamente o 38 sumiu durante a Campanha do Desarmamento, sob o olhar cumplice entre minha esposa e meu irmão caçula.

  Portanto, o buraco de bala na enorme mesa de reuniões, nas sedes do PCB, não ocorrera por nenhum episódio que tivesse sido de nossa iniciativa. Não devo dar maiores detalhes, por respeito ao envolvido. Mas naquele episódio, simbolicamente, nosso camarada se bastou de uma máquina de escrever Remington atirada contra a pistola militar 45 de seu agressor. Venceu a civilização.

Fausto Matto Grosso

 

3 comentários:

Paulo Roberto Cimó Queiroz disse...

Duas Winchester velhas, um 38, Os Lusíadas e uma máquina de escrever... O poder de fogo é pífio, mas certamente não é com essa régua que se mede o valor desse relato... Muito bom, Fausto!

Sergio Leal disse...

Conheci um camarada do PCB MS que não desgrudava de sua máquina de escrever. Creio que hoje porte um notebook. Sem querer parecer retrógrado ou conservador, com certeza, no episódio do 45, a máquina de escrever foi mais útil. E as Winchester devem estar bem conservadas. Boas lembranças, Fausto!

FAUSTO MATTO GROSSO disse...

Obrigado pelos comentários