DEUSES E FOGO NA FLORESTA
A natureza e as
florestas sempre foram protegidas pelos deuses. Na mitologia grega tínhamos Pã,
deus dos bosques e dos campos. Metade homem, metade bode, era filho de Zeus com
sua ama de leite, a cabra Amalteia. Vivia flanando pelos bosques tocando flauta
e dançando com sedutoras ninfas.
Já os etruscos tinham
Flora. Os sumérios, Inana, Os romanos, Sivano e Fauno. Os gauleses, Cerridwen e
os celtas a deusa Jhanna. Também os
encontramos na mitologia egípcia, hindu e maia. A Amazônia está mesmo
precisando da proteção dos deuses. Que não nos faltem a proteção de Iara e
Jaci, nossas deusas tupi guaranis.
Meio ambiente e
desenvolvimento sustentável têm se tornado assuntos de todos. As expressões
caíram na boca do povo. Existem duas possibilidades. Ou viraram um chavão,
destituído de significado real, ou representa um conceito que realmente se
tornou o zeitgeist – o “espírito dos tempos”, termo criado por filósofos
alemães – da nossa era.
Essa última hipótese
parece ser a mais verdadeira. O meio ambiente se tornou um dos problemas
globais mais candentes e se tornou um desafio da civilização. Meio ambiente e
desenvolvimento tem que caminhar juntos.
O termo
desenvolvimento sustentável foi definido pela Comissão Mundial sobre Meio
Ambiente e Desenvolvimento, da Organização das Nações Unidas, em 1987.
Desenvolvimento sustentável é aquele que “satisfaz as necessidades presentes,
sem comprometer a capacidade das gerações futuras de suprir suas próprias
necessidades”. Ou seja, não é apenas a questão da nossa qualidade de vida, mas
sim a dos nossos descendentes, portando é também, um desafio ético.
A questão não pode ser
entendida como um problema que possamos resolver dentro das nossas fronteiras e
sim exige grandes articulações civilizatórias, com acordos e entendimentos
amplos, pactuados em grandes fóruns globais, com os quais devemos ter
compromissos, embora nosso governo esteja sendo relutante quanto a eles.
Dentro deste contexto
surgem os incêndios na Amazônia. É certo que existem muitas falsas verdades e
muitos mitos nessa discussão. É falsa, por exemplo, a idéia de que a Amazônia
seja pulmão do mundo. Igualmente é mito que os defensores do meio ambiente são
pessoas radicais, fanáticas, poetas, inocentes-úteis que se mantêm alienadas da
realidade, sonhadores com um paraíso inexistente. Esses preconceitos nos cegam
e tiram nossa racionalidade.
A inteligência nos
remete a filtrar as narrativas, com a ajuda da ciência, que infelizmente anda
tão maltratada ultimamente. Mas ela é nossa única ferramenta na busca da
verdade.
Segundo Fernando
Henrique Cardoso, precisamos de bom senso e racionalidade, virtudes que ele
considera difíceis num país polarizado. Patriotismo não se mede por bravatas
nacionalistas, sobretudo quando insultuosas. A proteção do bioma amazônico é,
acima de tudo, do interesse do Brasil, um interesse coincidente com o dos
demais países que compartilham esse bioma e também com o do planeta.
Nestes dias da crise das queimadas, a questão
não pode ser tratada como tema ideológico. Tem ficado claro que o presidente
não tem a maioria da opinião pública ao seu favor, fato comprovados pelas
recentes pesquisas do Datafolha e da Consultoria XP. Segundo esta última, as
pessoas acham que os principais responsáveis são fazendeiros e posseiros (39%),
que a atuação do governo tem sido ruim e péssima (49%), que o país deve aceitar
a ajuda do G7 (70%), mesmo que esse tenha como motivação os interesses
políticos e econômicos (62%).
O Brasil precisa,
pois, de políticas ambientais ditadas pelo equilíbrio, como tem demandado a
população. Que os deuses da floresta nos protejam. Apelemos para a mitologia
indígena. Que o Curupira e a Caipora protejam o ambiente de seus predadores
humanos, ludibriando-os para que se percam na floresta, espantando suas presas,
batendo nos cães de caça e desorientando os caçadores com toda sorte de ruídos.
Fausto Matto Grosso
Engenheiro Civil e professor aposentado da UFMS
Nenhum comentário:
Postar um comentário