CASO DE POLÍTICA
O
avanço dos trabalhos das CPIs tem revelado o verdadeiro mar de lama
que tem envolvido a política brasileira desde há muito tempo.
O
PPS nunca se enganou a respeito do PT. Sempre disputamos com ele o
projeto de esquerda. Lançamos nas últimas quatro eleições, três
candidatos a presidente, exatamente para nos diferenciarmos –
Freire, Ciro e Ciro. Se em alguns momentos estivemos juntos, isso se
deveu mais a faltas de alternativas do que a uma política de
alinhamento. Não nos furtamos em nos afastar dos governos petistas
quando sentimos que passavam das medidas e insistiam em erros.
Entregamos cargos e excluímos quadros que não seguiram essa
orientação, a exemplo do Ministro Ciro Gomes.
O
surgimento do PT precisa ser mais conhecido, porque ali podemos
encontrar seus cromossomos políticos e perceber que a crise atual
não é apenas caso de polícia e sim um grande caso de política
equivocada.
Documentos
dos arquivos do General Golbery esclarecem que o surgimento do PT foi
facilitado pela Ditadura. O receio da ditadura era que o velho
Partidão pela sua política de alianças amplas, pudesse transformar
o PMDB num grande partido de massas e de esquerda. O regime amarrou
as mãos e os pés do PCB e do PcdoB e liberou o PT para tomar a
dianteira e ocupar o espaço de esquerda.
Assim
nasceu o PT, organizado a partir de três matrizes históricas e
políticas. A primeira delas foi o sindicalismo “moderno” do ABC,
apoiado fortemente pela central norte-americana AFL-CIO. Enquanto os
sindicatos de esquerda se organizavam no interior da Federação
Sindical Mundial que tinha como objetivo levar a luta dos
trabalhadores para a superação do capitalismo, a central americana
ensinou ao ABC de que seu papel era simplesmente lutar pelo aumento
do valor de venda da força de trabalho. Daí a autoproclamada
verdade de que Lula nunca foi socialista.
Outra
componente importante da estrutura político-ideológica do partido
foi a esquerda clerical católica. Essa lhe forneceu cultura
dogmática e maniqueísta, misturando religião com política,
criando a explosiva combinação fundamentalista. Existiam apenas
duas verdades antagônicas e entre elas nenhuma mediação: o céu e
o inferno, o bem e o mal, os crentes e os infiéis, nós puros e essa
gente que ai está.
Esse
pensamento maniqueísta marcou o comportamento histórico do PT: não
à frente democrática – cheia de burgueses, não ao colégio
eleitoral – expulsou deputados que votaram em Tancredo, não à
assinatura da Constituição de 88 – porque tinha hegemonia
burguesa, não ao Parlamentarismo – porque queriam ganhar sozinhos
com Lula. A visão do líder messiânico, salvador da Pátria, achou
campo fértil na cultura religiosa do povo brasileiro.
A
terceira componente fundante da concepção petista é representada
pelos derrotados quadros da luta armada, muitos deles oriundos de
dissidências esquerdistas do PCB, o mais representativo deles, o
deputado José Dirceu.
Desde
a ruptura com o stalinismo em 1958, o Partidão adotou a via
democrática para o socialismo, reforçada pela autocrítica
modernizadora após a crise do socialismo real. Sempre existiram
inconformados com o compromisso democrático do partido. Após 1964
essas correntes com vocação vanguardistas e autoritárias foram
abandonando o partido e construindo as organizações guerrilheiras
apoiadas por Cuba. São esses, que após a anistia, vão se aninhar
no PT onde conquistaram posições importantes para o aconselhamento
de Lula, levando junto consigo um profundo desprezo à democracia e
uma visão conspiratória e golpista. Nunca discutiram programas com
os “aliados” e sim os comprava com espaços de poder.
Na
verdade, falsos discípulos que eram, sentiram a oportunidade de usar
o inocente carisma salvacionista de Lula em atalho para a
“revolução”. A teia foi construída. Se no passado assaltavam
bancos para financiar a guerrilha, que mal haveria em comprar uns
trezentos deputados picaretas?
A
via sacra petista está sendo dolorida, mas o PT vai passar por essa
crise. Ótimo se aprender com ela. Ótimo se concluir que o poder
acima da sociedade não é revolucionário. Tenho certeza que o
ajuste de contas com a sociedade vai ser feito a partir de seu núcleo
democrático e ético. Daí poderemos contar com o PT para a luta
democrática e de esquerda.
FAUSTO
MATTO GROSSO
Executiva
Nacional do PPS
Artigo
para Correio do Estado em 8 de agosto de 2005
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