REFORMA POLÍTICA E CULTURAL
Mais
uma vez retorna à luz dos holofotes a questão da reforma política,
agora contando com a articulação ostensiva do Poder Executivo e de
sua base de apoio. Carregando a complexidade do tema e a diversidade
dos interesses envolvidos, estão na ordem do dia o estabelecimento
da votação em listas eleitorais pré-ordenadas para os
legislativos, o financiamento público das campanhas, a “janela”
para mudança de partidos um mês antes das convenções e o fim das
coligações nas eleições proporcionais.
Muitos
outros temas correm por fora, como é o caso do voto distrital e do
estabelecimento do sistema parlamentarista de governo, este último,
mesmo sendo o mais importante, pode, mais uma vez, vir de maneira
casuística para resolver eventual impasse na sucessão presidencial.
O
certo é que nenhuma medida pontual será capaz, sozinha, de produzir
o milagre da recuperação da crença na política, assim como,
mudança mais profunda no sistema político, não poderiam se
resumir, a mudanças das regras eleitorais e partidárias, mas sim
exigiriam um verdadeiro choque na cultura política das instituições
e dos cidadãos.
Para
começar, teríamos que contrapor o conceito de representação
política ao de “classe política” composta de donatários de
mandatos pessoais com “portabilidade”. Teríamos que acabar com a
promiscuidade entre a máquina pública e as campanhas eleitorais.
Teríamos que acabar com a imoral votação por amor, comprado.
Teríamos
ainda que por fim a esse jogo cínico existente entre políticos de
profissão e cidadãos-clientes, bem como ao jogo espúrio entre
políticos investidores e os financiadores-de-mandatos. Nos dois
últimos casos a ávida cobrança vem depois sob a forma de favores
pessoais ou do ressarcimento dos investimentos feitos, sempre
debitados ao erário público. Por trás de todas essas causas, que
produzem a crise da representação, se encontram a fragilidade da
cidadania, a debilidade da participação política e a fragilidade
dos partidos políticos. Brasileiros que “não gostam” de
política não podem reclamar da política que resulta das suas
omissões.
Não
há possibilidade de democracia sem participação cidadã. A
democracia também não pode prescindir de políticos e de partidos
políticos fortes, construídos em cima de programas nos quais se
possa acreditar. É a esse déficit cívico que deve ser atribuída a
qualidade, tão criticada, dos nossos representantes. Iguais aos
jabotis em cima das árvores, nossos deputados e senadores só
ascendem aos mandatos por votos conferidos pelos seus eleitores.
Nesse
sentido, a qualidade da representação está diretamente ligada à
qualidade da participação dos cidadãos. Mesmo considerando a
profundidade da mudança necessária, alguns avanços, se
adequadamente dirigidos, podem ajudar a desatar o atual nó da crise
da política e da crise da democracia representativa. Uma grande
marcha começa com o primeiro passo, já ensinava o professor Mao Tsé
Tung. Entretanto, se de um lado a crise atual da representação pode
ser a parteira de mudança, é preciso ter claro que ela será feita
pelos políticos nascido das velhas formas que entraram em crise.
É
necessário, portanto a pressão e a vigilância da opinião pública
para que as expectativas hoje existentes não se frustrem e a reforma
não se constitua em mero artifício esperto, para abrir as janelas
para mudanças de partidos ou para aprovar um terceiro mandato
presidencial, como alguns analistas têm apontado.
FAUSTO
MATTO GROSSO
Engenheiro
civil e professor da UFMS
faustomt@terra.com.br
Publicada
no Jornal da Cidade - 17/05/2009
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