DESAPARECENDO AS DIFERENÇAS
(Depoimento
de Viagem VIII – Jornal da Cidade - )
“Artículo
1. La República de Cuba es um Estado socialista de obreros y
campesinos y demás trabajadores manuales e intelectuales”-
Constituição Cubana – 1976.
Santa
Maria del Mar, acerca de 40km de Havana, é uma região
procuradíssima pelas suas praias. Visitá-las faz-nos entender a
afirmação dos cubanos de que conhecer Havana é desconhecer Cuba. O
governo investe o fundamental de seu esforço fora da capital e uma
das provas é esta região de veraneio, com uma excelente estrutura
para o turismo interno e externo.
Os
hotéis (alguns imensos e equivalentes aos nossos 4 estrelas) e as
casas de veraneio são implantadas em meio a enormes parques
sombreados por pinheiros . Na época de nossa visita, estavam lotados
de estrangeiros: americanos , holandeses, alemães e franceses que
tiravam, com os pés nas costas, o inverno cubano de 20 graus.
Entretanto,
no verão , estrangeiro não tem vez; a maior parte das vagas é
ocupada pelos trabalhadores destacados, selecionados pelos próprios
companheiros de trabalho e que recebem do governo toda a gratuidade
para suas férias.
Em
Santa Maria del Mar, embarcamos em um microônibus Toyota, lotado de
estrangeiros, com guia poliglota para conhecer um pouco do campo
cubano. No caminho, passamos por extensos campos petrolíferos (que
produzem cerca de 30 por cento do consumo nacional) e pela fábrica
do Run Havana Club (antigo Run Bacardi), a cujas instalações não
são permitidas visitas.
Em
Cuba, existem no campo três tipos de propriedade: a camponesa
(limite de 54 há e nesta modalidade estão 30 por cento das terras
agricultáveis), a cooperativa (30 por cento) e a estatal (40 por
cento). A Comunidade Rural de Jibacoa, que visitamos , é uma
típica fazenda estatal e nela se pratica a criação de gado, tanto
para engorda como para leite.
Pudemos
ver então, com nossos próprios olhos, o que a propaganda socialista
sempre alardeou com orgulho: a tendência ao gradativo
desaparecimento das diferenças entre a vida no campo e na cidade.
Jibacoa,
possui uma população de 1 500 pessoas (é interessante comparar com
as fazendas de gado que conhecemos) concentradas na sua bem
urbanizada sede. Entre os serviços colocados à disposição desses
trabalhadores encontramos: barbearia, cabeleireira, creche,
biblioteca (com alguns clássicos brasileiros como Machado de Assis e
Jorge Amado) auditório polivalente (cinema, teatro, reuniões),
escola primária e secundária , salão de exposições (arte e
artesanato – por ocasião de nossa visita exibia uma exposição de
artesanato mexicano), restaurante, bar, loja de roupas, supermercado
e posto médico com ambulância.
As
habitações são blocos de apartamento de 4 pavimentos, muito bem
conservados. Cada bloco possui seu Comitê de Defesa da Revolução
–CDR- e exibe no seu hall de entrada a relação dos moradores que
se destacam pelo trabalho voluntário e pelo espírito
revolucionário. Visitamos um desses blocos, onde fomos
agradavelmente recebidos pelo seus moradores. Os apartamentos têm
dois ou três quartos , sala , cozinha banheiro e pequena área de
serviço. Não se paga aluguel. Como o problema habitacional ainda
não está satisfatoriamente resolvido em Cuba, as boas condições
de habitação oferecidas no campo são grandes atrativos para os
moradores das cidades , muitos dos quais acabam indo morar e
trabalhar no campo.
Pelo
fato de nossa visita ter sido em um Domingo, não conseguimos ver a
fazenda em sua produção rotineira, mas nos deu a oportunidade de
entrar em contato com muitos trabalhadores que curtiam o seu dia de
descanso, freqüentando a biblioteca , preguiçosamente jogando
dominó, cartas ou xadrez e praticando esporte, numa agradável vida
comunitária. Confundidos no meio de turistas norte-americanos,
canadenses e europeus, pudemos entender entretanto os espanhólicos
e latínicos gracejos que dirigiam às mulheres da nossa excursão.
Até nisso desapareceu a diferença entre a cidade e o campo.
Visitamos
também uma propriedade camponesa, vizinha à Comunidade Jibacoa.
Nesta pequena área de cerca de 12 há, vivia um casal que não
tinha aderido ao plano estatal (o que é voluntário) e dedicava-se
ao plantio de feijão e mandioca, além da cultura de subsistência.
A residência desse casal, embora bem mais modesta que as
habitações da fazenda estatal, ofereciam condições dignas de
moradia. O teto era de sapé, mas bem vedado, o chão ladrilhado, as
paredes de madeira pintada impecavelmente de cal. A mulher já era
aposentada e ganhava o salário mínimo (equivalente a Cr$ 85 000,00
) e o marido, além de tocar a pequena roça, era leiteiro prestador
de serviços na vizinha fazenda estatal, onde recebia remuneração
mensal de Cr$ 150 000,00. Além disso, tinham todos os benefícios
dos demais trabalhadores , tais como cota de alimentação pela
“liberta” (subsidiada), assistência médica (que é gratuita).
As
propriedades camponesas, embora pertençam individualmente a seus
donos, normalmente produzem segundo uma orientação do Planejamento
Nacional, do qual elas participam através da sua entidade
representativa – a poderosa Anap (Associação Nacional dos
Agricultores Pequenos ) – e nesta medida sempre encontram mercado e
preços compensadores para seus produtos, que podem então ser
vendidos livremente ou ao Estado.
Comparando
as condições de vida e trabalho dos camponeses cubanos com as dos
camponeses brasileiros, a diferença é da àgua para o vinho, mas a
diferença com a fazenda estatal também é bastante grande.
Por
isso, através do livre convencimento, o governo espera a gradativa
transformação dessas propriedades camponesas em formas mais
avançadas e produtivas como são as cooperativas e as estatais.
Mas,
nesta andança pelo campo cubano, uma coisa me impressionou muito
especialmente: próximo a um dos blocos de apartamentos da Comunidade
Jibacoa estava preservada uma velha choupana , típica de antes da
Revolução. Os mais velhos, que viveram o antigo regime , disso não
precisam, basta-lhes o entusiasmado depoimento de vida que
orgulhosamente fazem ao turista. A velha choupana comparada com a
sede atual da fazenda faz o mesmo contraste do machado de pedra com o
satélite artificial, do arado rudimentar com o moderno trator
soviético, do antigo povo analfabeto e doente com o atual povo
cubano. Segundo eles, a diferença entre o seu passado e o seu futuro
é a mesma entre a exploração e a cooperação recíproca, entre o
capitalismo e o socialismo.
FAUSTO
MATOGROSSO
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