UMA NOVA BATALHA DE ITARARÉ
A crise política atual foi contratada ainda durante o Governo Dilma Rousseff. Sob o comando de ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha, hoje preso, foram aprovadas as emendas impositivas, para cabrestear o Executivo petista, com o entusiasmado apoio do então deputado Jair Bolsonaro. Agora chegou a fatura.
Bolsonaro foi eleito
dentro de um clima de profunda revolta da população contra os políticos e os
partidos e fez sua campanha eleitoral surfando nessa descrença.
Irresponsavelmente.
Durante a formação do
governo, sem dar trela aos partidos, o Presidente montou sua equipe com quadros
militares e do grupo ideológico olavista, pelo qual mantinha simpatia. Negociou
também indicações e apoios com as bancadas temáticas: ruralista (119 votos),
evangélica (82 votos) e da segurança (32 votos). Com essas pretendia montar
base de apoio no Congresso.
O governo vende para a
população a falsa ideia de que não fez o toma lá dá cá e que a sua é uma
administração virtuosa que não aceita pressão dos políticos. É mentira. Houve
sim o loteamento anárquico entres seus grupos de apoio que, aliás, vivem em
choques. O mérito, no sentido da qualificação, passou longe.
No Congresso o Governo
não conseguiu formar uma base de apoio. A aposta que fazia nas bancadas
temáticas não deu certo, como se previa, pois todo o processo legislativo é
baseado nas estruturas dos partidos políticos, com destaque para as lideranças
partidárias. Elas é que decidem o rumo e a articulação das votações, juntamente
com os poderosos presidentes das duas Casas.
Bolsonaro hoje é uma
espécie de primeiro-ministro sem maioria no Congresso. Como já reclamou,
sente-se uma rainha da Inglaterra, no reino de Rodrigo Maia e Alcolumbre. De um
total de 513 deputados, apenas 89 são alinhados com o governo, 268 são incertos
e 156 são de oposição. Entre os 81 senadores, 16 são alinhados com o governo,
43 são incertos e 22 são de oposição. Os incertos são os comandados pelos
presidentes da Câmara e do Senado.
Embora seja da
tradição brasileira que todo presidente consegue montar maioria e controlar o
Congresso, tal não está acontecendo. O que se vê é o Legislativo, valendo-se da
sua autonomia, assumindo o protagonismo da inciativa política, para desconforto
do Presidente.
É comum, partidos
fazerem coligações para conseguir eleger seus candidatos. Bolsonaro
praticamente não a fez, de maneira semelhante a Collor. Nessa situação está
obrigado a fazer negociações parlamentares para governar. Foi assim com o PSDB que teve que negociar
com o PFL; O PT se uniu ao grupo político do senador empresário José Alencar,
fazendo-o vice de Lula; e Dilma foi procurar o PMDB de Michel Temer para
governar. Goste-se ou não, essa é a realidade dura, pelo menos enquanto não ser
fizer a reforma política.
Bolsonaro tentou
montar uma base parlamentar a partir do PSL, partido pelo qual foi eleito, mas
brigou com os seus dirigentes por causa das verbas partidária e eleitoral. Está
tentando montar um novo partido, mas se encontra completamente isolado. Não fez
coligação, não tem condições de fazer coalizão, opta então pelo governo de
colisão.
Isolado e com equipe
fraca, não consegue ter iniciativa e governar. Na falta de resultados, apela
para a vitimização e culpa o Congresso e o STF. Junta-se a isso os números
pífios do crescimento, a crise financeira e a epidemia coronavirus e está
pronto o clima para a tentativa aventureira de zerar o jogo, a lá Jânio
Quadros. É nesse contexto que apoia, de maneira populista e irresponsável, a
realização de manifestações. Esse apelo direto à população, por cima das
instituições é uma das características do fascismo.
Comecei a escrever
este artigo quando a manifestação do dia 15 ainda estava marcada, mais tudo
mudou. Mas não precisava nem do ilustre vírus, nem mesmo do gás de pimenta, era
só o Supremo, mandar algum estagiário jogar uma pitada de rapé e o ato heroico
e patriótico, se transformaria em uma nova versão da Batalha de Itararé, a que
não houve.
FAUSTO MATTO GROSSO,
Engenheiro e professor aposentado da UFMS
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