NÓS CONTRA ELES
O Brasil hoje é um
campo de guerra. Cada um procurando um inimigo para esmagar. Vivemos tempos de
ódio e de medo. Cabe aqui a advertência de Mahatma Gandhi: olho por olho e o
mundo acabará cego.
É muito comum pessoas
que, na busca de sua de sua afirmação individual, expressam sua diferença por
contraposição a um “inimigo”. O inimigo dá sentido para sua vida. O mesmo
ocorre com organizações políticas. Nesse sentido é a luta contra um inimigo,
real ou imaginário, que as fazem existir. Mais grave ainda quando essa divisão
não é feita tendo por base a ideologia, mas sim, o oportunismo eleitoral.
Assim, surge a prática
de afrontar divergentes e antagonistas, de difamar e espalhar notícias
inverídicas (fake news), de agitar e chantagear, de insuflar os ânimos para
agredir adversários e transformá-los em inimigos. Essas são práticas que negam
a democracia e bloqueiam a vida civilizada.
O conceito de Inimigo
não serve para a política. Inimigo não é feito para falarmos com ele, e sim
feito para a guerra.
Não servem aqui,
portanto, os ensinamentos do general chinês Sun Tzu, na “Arte da Guerra”,
tampouco os de Von Clausewitz que associam guerra e política, orientando que a
política deve ser a preparação para a guerra.
Em uma sociedade
democrática, que queremos ser, a política deve ser a prática de escutar o
outro, o diferente e o divergente. É preciso despir-nos de nós próprios, de
largarmos a obsessão com a nossa identidade. Na realidade, a solução de um
problema dificilmente virá apenas da nossa verdade, mas sim uma nova síntese
que também incorpora as verdades do adversário.
Política é o
instrumento civilizado de nos relacionar com o outro. Isso não significa
despirmo-nos da nossa identidade, mas sim exploramos as possibilidades de
avançar, mesmo limitadamente, onde possa existir espaço para algum consenso que
permita avançar a nossa causa. Fora disso é a guerra.
Nos últimos anos
surgiu, entre nós, um partido que se afirmou com essa lógica. Todos conhecem a
história e os responsáveis pelo “nós contra eles”. Nós, que representamos o
povo, “eles”, os inimigos do povo. A ideia de bons contra maus, de santos
versus golpistas é o caminho mais curto para a quebra do pacto democrático que
nos sustenta, ou deveria.
Aqui entre nós, a
arrogância salvacionista do projeto de 20 anos de poder era uma clara
demonstração de falta de compromisso com a democracia e com a alternância do
poder. Do alto da sua prepotência chegou
a ameaçar “extirpar o DEM da política brasileira”, demonstrando seu desprezo
pelo respeito ao pluralismo.
Em algum momento, em
alguma curva da estrada, o “nós contra eles” termina por se tornar o “eles”
contra nós todos.
Explode agora o
conservadorismo e o autoritarismo. “Eles” saíram do armário e hegemonizaram uma
multidão de inocentes úteis, de incautos e simplórios despolitizados, cheios de
si e dispostos a construir uma nova hegemonia. Trata-se de uma regressão
histórica.
Em tempos recentes os
sinais de perigo já se materializam. Em 2013 a aparição dos Black blocs,
recentemente os tiros no ônibus de Lula em uma estrada do Rio Grande do Sul,
também no acampamento pró-Lula em Curitiba e o deplorável atentado contra
Bolsonaro.
Que esses graves
episódios, façam os brasileiros repensarem a raiva, essa péssima conselheira, e
apostarem na tolerância democrática. Essa postura requer que todos encarcerem
os seus demônios e mais uma vez aprendam com a sabedoria popular de que é
impossível existir só pessoas boas de um lado e só más do outro.
Também aprendamos,
mais uma vez, com Mahatama Gandhi que o “fraco jamais perdoa, o perdão e uma
das características do forte”.
Engenheiro civil e professor aposentado da UFMS
14.09.2018
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