O QUE PRECISA MUDAR EM MATO GROSSO DO SUL?
A
humanidade conviveu muito tempo com o mito de que a simples criação
de riquezas, propiciada pelo crescimento econômico, seria uma
condição necessária e suficiente para que as pessoas vivessem
melhor.
Com
o tempo, essa visão foi derrotada e foi se afirmando a idéia de que
era necessário colocar as pessoas no centro do desenvolvimento e não
a economia. Era a afirmação da idéia do “desenvolvimento
humano”.
O
IDH – Índice de Desenvolvimento Humano, calculado pela ONU a
partir do início dos anos 90, passou a ser usado para avaliar a
condição humana, acrescentando à dimensão renda as dimensões
longevidade e educação.
Para
atualizar os quesitos a serem levantados para cálculo do IDH em
2010, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento realizou,
recentemente, uma ampla pesquisa qualitativa que envolveu mais de
quinhentos mil brasileiros, convidados a responder a instigante
pergunta: “O que precisa ser mudado no Brasil para sua vida
melhorar de verdade?”
Os
resultados foram contundentes, especialmente para aquele que imaginam
que tudo anda bem e que as pessoas estão satisfeitas com a realidade
do seu país e com a sua vida. Há uma imensa aspiração por
mudanças, que deve ser considerada pelas lideranças políticas no
processo eleitoral que se aproxima.
Os
resultados, consolidados para Mato Grosso do Sul, revelaram que os
temas específicos considerados mais importantes foram: educação
(19%), políticas públicas (12,5%), violência (13%), emprego
(10,8%), meio ambiente (8,9%), saúde (6,7%), infraestrutura (3,4%),
judiciário (2,9%), impostos (2,8%) e pobreza (0,6%).
A
pesquisa ainda revelou dois temas transversais prioritários que
repassam todos os temas específicos: valores e corrupção.
Esses
resultados questionam as tradicionais prioridades das lideranças
políticas e dos governantes. A tradicional disputa entre quem fará
mais “obra” de infraestrutura, segundo essa pesquisa, é
irrelevante para a população.
O
importante não é o prédio escolar, mas a qualidade da educação
que se pratica no seu interior, sua capacidade de construir
cidadania, competência, autonomia, consciência, civismo,
responsabilidade pessoal e social. Qual governante trocaria hoje
alguns metros cúbicos de concreto ou alguns quilômetros de asfalto,
pela internet pública e gratuita para todos os cidadãos ou por um
grande salto no patamar de remuneração e qualificação dos
professores? O mundo atual baseado na informação, no conhecimento e
na aprendizagem exige o repensar revolucionário do papel da
informática e da educação na viabilização do país. No campo da
educação, por que não assumir o grande desafio de,
processualmente, igualar a carreira dos professores da educação
básica à carreira dos professores universitários? Porque não?
Na
referida pesquisa, o segundo tema mais valorizado é o de políticas
públicas. Esse quesito engloba a questão da oferta de bens e
serviços públicos competentes e efetivos, que funcionem em
benefício e respeitando a população. Trata-se da saúde sem fila
nas madrugadas, próxima e com resolutividade, o respeito humano no
atendimento. O transporte público sem aperto, confiável, limpo e
valorizado como prioritário. A segurança pública que dê
tranqüilidade à vida das pessoas, sem deixá-las a mercê do poder
real do crime organizado, da bandidagem, do trafico de drogas e da
barbárie da violência sempre presente.
O
cidadão não percebe, no seu cotidiano, a presença e a competência
do serviço público. É preciso que as políticas públicas saiam
das estatísticas duvidosas, dos outdoors, dos meios de comunicação,
das inaugurações pomposas e dos palanques e percorram as ruas e
bairros das cidades.
Atravessando
essas e outras prioridades temáticas está a demanda pela afirmação
de valores e pelo fim da corrupção no Estado e na sociedade.
Assim,
está apontado o inconformismo com a subversão de valores,
representada pela desonestidade, pelos escândalos políticos, pelos
“não sei e não vi” pelos choros falsos de “lágrimas de
crocodilo”, pelo individualismo, pela “lei de Gerson”, pela
falta de respeito ao próximo, ao contribuinte e ao consumidor, pela
falta de solidariedade pessoal e social, pela mentira, pela alienação
e pela hipocrisia.
O
descontentamento com a corrupção abrange desde aquela praticada nos
governos, nos parlamentos e na justiça, até aquela que é cometida
na sociedade, como o suborno, a sonegação de impostos, o
contorcionismo cínico do “jeitinho brasileiro” e outras tantas
impropriedades do comportamento cotidiano.
A
afirmação de valores e o clamor pelo fim da corrupção, como temas
transversais, exigem novos comportamentos em todos os âmbitos da
vida da sociedade: na educação, nas políticas públicas, na saúde,
na construção das obras públicas, na cobrança dos impostos e na
relação como o meio ambiente e com a juventude.
Há,
portanto, no ambiente, um clamor silencioso por mudanças, que não
aparece quando a disputa política e eleitoral se dá entre “quem
fará mais do mesmo”. É lógico que a população se decida por
alternativas simplórias e medíocres, pela falta de alternativas e
de mensagens transformadoras.
Imagino
que, se surgirem lideranças, com credibilidade, que subvertam essa
lógica tradicional, é bem possível que se repitam casos como o de
Barak Obama nos Estados Unidos ou Fernando Gabeira na sua quase
vitória no Rio de Janeiro. A grande questão é saber se existe, ou
quando existirá, entre nós, algum estadista, sintonizado com o
clamor dos tempos atuais e disposto a liderar um processo de mudanças
verdadeiras.
Fausto
Matto Grosso
Engenheiro
e professor da UFMS
faustomt@terra.com.br
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